quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Paradoxo do tempo livre – Entrevista de Prof. Renato Dias Martino para o jornal Diário da Região.

Paradoxo do tempo livre – Entrevista de Prof. Renato Dias Martino para o jornal Diário da Região.

Paradoxo do tempo livre – Entrevista de Prof. Renato Dias Martino para o jornal Diário da Região.




Elen Valereto - As pessoas reclamam que nunca têm tempo para nada, mas quando conseguem, não sabem aproveitar as horas vagas. Por que isso acontece? Falta desafios ou compromissos?


Prof. Renato Dias Martino - Se partirmos da ideia de que o desejo está naquilo que não podemos ter e quando temos já não desejamos mais como antes, então já podemos solucionar boa parte dessa questão. O fato é que quando se imagina um tempo livre na vida, na maioria das vezes, se preenche esse tempo (na imaginação) com várias coisas que se pretende fazer, contudo, muito pouco se avalia as reais possibilidades disso. Assim, quando se consegue arrumar um tempo livre na realidade, se percebe que talvez não seja capaz de tornar proveitoso esse tempo.


Elen Valereto - Quais são os sentimentos que acometem uma pessoa que está com horas ociosas e não sabe como utilizá-las?


Prof. Renato Dias Martino - Talvez essa pessoa possa estar utilizando de alguma forma esse tempo, sem saber que esta o fazendo. A necessidade de reservar um tempo para retirar a mente dos compromissos e das realizações é tão importante quanto efetivamente realizar. Entretanto, se a proposta é realmente realizar algo, penso que existe a necessidade anterior de se estabelecer projetos. Sem se estabelecer projetos dificilmente se realizará qualquer que seja a idéia. Quando se estabelece um projeto, torna-se possível avaliar as reais possibilidades de efetivação do mesmo.


Elen Valereto - Muitas pessoas dizem que as horas de relaxamento são ideais para estimular a criação. Mesmo assim, permanecem inertes ou perdem tempo com televisão ou internet, e se sentem culpadas no final do dia (ou fim de semana) por terem desperdiçado o tempo de sobra. O que essas pessoas podem fazer para fugir dessa situação?


Prof. Renato Dias Martino - O momento da criação é sempre um processo imaginativo e sem compromisso direto com a realidade. Se estiver vinculado de forma direta com a necessidade de materialização, não pode ser chamado de criação. As maiores criações são geradas de um momento descontraído de ócio, onde não exista a necessidade de se concretizar nada. Essa idéia é difícil de se conceber num mundo onde o que se exige é justamente o contrario da criatividade. O que o mundo contemporâneo exige é justamente a produção padronizada que nada tem haver com criação.


Elen Valereto - Quais são os sinais de que estamos desperdiçando parte de nossa vida?


Prof. Renato Dias Martino - A idéia de se desperdiçar tempo é falsa. Isso nunca acontece. Usamos nosso tempo dentro de nossas capacidades. Se não estamos “produzindo” como o mundo nos cobra é por que ainda não somos capazes disso. Contudo, se o que se pretende é a realização, que é dependente da criatividade, então teremos que ser tolerantes quanto nosso tempo ocioso até que a criatividade chegue.


Elen Valereto - Quais são as dicas para descobrir a valorizar e usar as horas livres em nossas vidas?


Prof. Renato Dias Martino - A dica é respeitar o próprio tempo e a própria capacidade. Não podemos nos forçar a fazer aquilo que não somos capazes, pois certamente faremos mal feito ou continuaremos nos cobrando de algo que na realidade não existe.

Matéria na integra: http://www.diariodaregiaodigital.com.br/Flip/Flip_Books/Bem_Estar-20111127/index.html#/6/

Prof. Renato Dias Martino
Psicoterapeuta e Escritor
Fone: 17-30113866
renatodiasmartino@hotmail.com
http://pensar-seasi-mesmo.blogspot.com

“General Médici, quando o Sr. vai redemocratizar o Brasil?”


Por Appólo Nátali(*)
Brasil, 1970.
Havia tempo para tudo: para o Estado perseguir, torturar, assassinar. Tempo de fazer calar. Tempo de danação das almas, chamado de milagre. Tempo em que nos faziam engolir o cativeiro como um doce inferno. Tempo de mãos cheias de sangue. Tempo de a imprensa driblar os limites da lei e da ética, os limites de todos nós, nos fazendo ler o que queria que lêssemos e não fazendo ler o que não queria que lêssemos.

Quem viveu esses tempos, sabe. Quem não viveu e quer saber, e saber certo, não folheie a história oficial, por favor.
Eu estava na redação do Jornal da Tarde, em pé, em frente da mesa do meu sempre querido editor, Antonio Euclides Teixeira, o Tim, autor da bem sucedida biografia do lendário médico do Corinthians, Joaquim Grava.

Redação do Jornal da Tarde. Sabem o que significa isso? Significa meu coração inchado de emoção por trabalhar para esse jornal que vi nascer e que sempre será um mito na imprensa brasileira. Foram 8 anos lá. Quem sabe Mino Carta, o seu criador, se lembre de mim fungando no seu cangote, ávido por aprender. Foram aperitivos os outros 30 anos entre Rádio Eldorado, Estadão e Agência Estado.
A pauta era a seguinte: o Tim me disse que eu iria cobrir o jogo do São Paulo Futebol Clube contra a seleção da Hungria, na inauguração final do estádio Cícero Pompeu de Toledo, o Morumbi dos são paulinos. Digo inauguração final porque houve duas: uma quando o estádio estava pela metade e outra quando estava pronto.
O general presidente Emílio Garrastazu Médici participaria da inauguração em 1970.

De pé, em frente da mesa do Tim, perguntei àquele sisudo mas afável editor, por pura brincadeira, o que ele queria que eu perguntasse ao Médici. A prova de que perguntei por brincadeira é que o mundo inteiro sabia, o Tim mais ainda, que ninguém ousaria fazer qualquer pergunta ao general presidente naquela época em que a liberdade não abria suas asas sobre nós.

Sua resposta me pareceu brincalhona. Hoje, passados mais de 40 anos, imagino que ele tenha sido um pouco irônico, ciente da impossibilidade de se fazer uma pergunta ao general e muito menos obter resposta. Era a pergunta que não calava na garganta da maioria dos brasileiros.

Era aquela pergunta atravessada na garganta dos que se davam conta do ar de cativeiro que impregnava o País. A pergunta que toda alma desprendida da acanhada meta de apenas preservar o estômago, ansiava por fazer olhando nos olhos do general presidente:

-Pergunte ao Médici quando ele vai redemocratizar o País, disse o Tim, cabeça baixa, meio que desolado.

Deus concedeu a mim essa graça, a mim, em pleno trabalho de reportagem de um jogo de futebol. Varei um bambuzal de seguranças. Fiz de conta que estava à frente dos estandartes que invadiam a Bastilha. Ergui os olhos para o palanque no centro do gramado. Fiz de conta que bradava pelos Direitos do Homem:

-Presidente, o senhor tem prazo para redemocratizar o país?

O general estancou, girou a cabeça para a direita e de lá de cima do palanque improvisado para erguer a Bandeira, os seus lhos claros, parados, se fixaram em mim por alguns instantes que não tinham fim. Não decifrei seu pensamento.

Por quatro vezes sofri desmaio na vida. Embora dormindo, eu sabia o que se passava à volta. Não sei se é assim com todo mundo. A primeira vez, quando era criança, caí com o estômago sobre o sapato que soltou do pé e ficou girando no chão como um pião. O desmaio era um sono gostoso e eu estava consciente de que uma vizinha do cortiço onde eu morava, na rua coronel Cintra 129, na Mooca, a dona Assunta Junqueira de Andrade, tia da minha primeira namorada, me carregava até um tanque de lavar roupa para molhar meu rosto.

 A segunda, eu era jovem, minha velocidade no futebol foi bloqueada com um soco no estômago por um zagueiro. Dormindo, vi meu pai sair da torcida e nocautear o zagueiro. Meu pai foi pugilista.

 A terceira foi em 1968, no tempo dos incêndios em emissoras de TV. Fui procurar a apresentadora Hebe Camargo na antiga TV Record, na Avenida Miruna, sobre um desentendimento que ela havia tido numa gravação com o cineasta Lima Barreto. Fui nocauteado no saguão da emissora por um segurança. Dormindo, vi o comediante Ronaldo Golias passar perto de mim.

A quarta vez que desmaiei foi no Morumbi, em 1970.

Assim que fiz a pergunta ao presidente, um murro estourou no meu ouvido e eu dormi. Mais uma vez estava consciente do que acontecia. As pessoas que me carregavam, certamente seguranças do general Médici, todos à paisana, explicavam aos circunstantes: “ele tomou todas.”

Acordei, graças a Deus acordei, na calçada fora do estádio, todo mundo me olhando, com pena. Como é humilhante tomar um soco no ouvido. Mas como me senti um herói destemido após um ato de bravura. Tinha que fazer a reportagem do jogo. Paguei ingresso e nas arquibancadas anotei os gols e os comentários com o ouvido colado no rádio de um torcedor. Estonteado, o jogo lá longe no campo distante me parecia uma correria sem sentido.

A abertura da matéria publicada na Edição de Esportes do Jornal da Tarde, que na época era vendida separada nas bancas às segundas feiras, está lá para quem quiser ver, com estas exatas palavras: o São Paulo ganhou muita simpatia, ontem, com a inauguração do seu majestoso estádio, mas continua sem time – empatou por 1 a 1, com a seleção da Hungria.

Nunca contei esta história para ninguém, nem para o Tim.

sábado, 26 de novembro de 2011

heróis

“Só vos peço uma coisa: se sobreviverdes a esta época, não vos esqueçais! Não vos esqueçais nem dos bons, nem dos maus. Juntai com paciência as testemunhas daqueles que tombaram por eles e por vós.Um belo dia, hoje será o passado, e falarão numa grande época e nos heróis anônimos que criaram a História. Gostaria que todo mundo soubesse que não há heróis anônimos. Eles eram pessoas, e tinham nomes, tinham rostos, desejos e esperanças, e a dor do último de entre os últimos não era menor do que a dor do primeiro, cujo nome há de ficar. Queria que todos esses vos fossem tão próximos como pessoas que tivésseis conhecido como membros da vossa família, como vós mesmos.”
Testamento sob a Forca - Júlio Fuchik - Edit. Brasil Debates, 1980
 
http://www.youtube.com/watch?v=m-pgHlB8QdQ&feature=share