quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Para o Brasil ganhar seu primeiro Nobel

Receita para o Brasil ganhar seu primeiro Nobel: “paciência e planejamento estratégico”

Entrevista com o astrônomo Brian Schmidt, de 45 anos, pesquisador da Universidade Nacional da Austrália e co-ganhador do Prêmio Nobel de Física de 2011, por descobrir que o universo está se expandindo de forma acelerada (em vez de estar em desaceleração, como se imaginava até então). Publicada na edição de hoje do Estadão, com algumas informações adicionais

Herton Escobar / O Estado de S. Paulo
A ciência brasileira está avançando rapidamente e tem plenas condições de ganhar um prêmio Nobel, mas será preciso paciência e muito planejamento estratégico para chegar lá. Segundo o astrônomo Brian Schmidt, vencedor do Nobel de Física em 2011, muito mais que um símbolo de mérito individual, a conquista do maior prêmio da ciência tem de ser vista como parte de um esforço coletivo, que reflete a capacidade do país de organizar com eficiência todo o seu sistema de educação, pesquisa e inovação, desde a escola primária até a indústria.
Os prêmios virão naturalmente se você fizer tudo certo. Mas tem de ser tudo mesmo”, afirma Schmidt. “Só colocar dinheiro na ciência não basta; a ciência tem de ser parte de uma estratégia maior. A educação, a ciência e a indústria têm de avançar juntas. É um processo gradual, lento, que pode ser um tanto frustrante, mas em algum momento você vai olhar para trás e ver como as coisas melhoraram. E no meio do caminho você vai ganhar um Nobel.”
Schmidt passou a semana passada no Brasil, participando de uma conferência sobre cosmologia na Universidade de São Paulo. Em um dos intervalos, conversou com o Estado na lanchonete da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, onde ocorreu o evento.
Sem formalidades e bem humorado, Schmidt defendeu a adesão do Brasil ao Observatório Europeu do Sul (ESO), tema de muita ansiedade na comunidade astronômica brasileira (veja post abaixo). Além, é claro, de falar sobre o futuro do universo (“vazio e gelado”), sobre aspirações humanas e até um pouco de religião.
O senhor disse uma vez que a ciência não precisa mais de gênios. Pode falar um pouco mais sobre isso – no contexto de um país como o Brasil, que ainda sonha em ganhar seu primeiro Nobel?
A ciência hoje é muito diferente do que costumava ser. No mundo moderno, prêmios Nobel não são ganhos por nerds esquisitos que não sabem se relacionar socialmente; são ganhos por pessoas que sabem trabalhar em grupo, com colaboradores ao redor do mundo, e que são capazes de juntar recursos e ideias para fazer grandes descobertas de forma coletiva. Há pessoas geniais, claro, mas elas são a raridade. O trabalho dos gênios de antigamente hoje é feito em sua maior parte por computadores, pela tecnologia.
Qual a melhor estratégia, então, para ganhar um prêmio Nobel?
O ideal, no caso do Brasil, seria promover uma grande variedade de atividades, porque os prêmios Nobel surgem quase sempre como uma surpresa, e por isso é muito difícil prever onde eles vão aparecer. As surpresas não podem ser planejadas, mas você tem de estar envolvido em muitas atividades para que elas tenham maiores chances de acontecer. Prêmios Nobel são muito difíceis de produzir e talvez por isso eles sejam tão importantes. Eles são simbólicos de toda a estrutura de pesquisa de um país. Não adianta achar que você vai investir em duas ou três pessoas brilhantes, dar a elas tudo que precisam e elas vão ganhar o prêmio Nobel; não é assim que funciona. É um objetivo que envolve um monte de coisas: como você investe nas suas universidades, nos seus jovens talentos; como você educa suas crianças; se seus pesquisadores têm oportunidades para viajar e trabalhar em colaboração com equipes internacionais.
Como o senhor vê a ciência brasileira no mundo hoje?
Eu diria que a ciência brasileira está nos seus primórdios, mas com um futuro promissor. A maneira como os cientistas brasileiros interagem com o resto do mundo mudou muito nos últimos dez anos. Não há dúvida de que o Brasil está crescendo rapidamente, mas é importante que o País seja paciente e estratégico em seus investimentos. Uma coisa que eu noto claramente é que o sistema universitário aqui está cada vez mais forte e isso é muito importante. Outro fator essencial, porém, é garantir que o maior número possível de pessoas tenha acesso a uma educação de qualidade, para que você possa selecionar os seus talentos. O Brasil tem quase 200 milhões de pessoas e posso te garantir que o talento está espalhado igualmente por toda a população, em todos os lugares; então, para obter o melhor custo-benefício nos investimentos, você precisa incorporar o maior número possível de pessoas ao sistema. Mas também não adianta investir numa coisa só de cada vez; a pesquisa, as universidades, as escolas e a indústria têm de avançar simultaneamente.
No caso específico da astronomia, o senhor acha que o Brasil precisa virar sócio do ESO para ser competitivo?
Absolutamente. Para ter impacto na astronomia, assim como em outras áreas da ciência, é preciso ter bons pesquisadores. E esses pesquisadores precisam ter acesso à melhor infraestrutura de pesquisa possível. Na Austrália, onde já se faz astronomia desde a década de 1940, nossa prioridade número um é entrar para o ESO, justamente por isso. Porque para ser competitivo na astronomia você precisa ter acesso a uma grande variedade de instrumentos, para uma grande variedade de aplicações, e sabemos que não somos capazes de fazer isso sozinhos. O Brasil e a Austrália não são a mesma coisa, mas acho que a mesma lógica se aplica aqui. A entrada no ESO tem de ser vista como parte de uma estratégia maior de desenvolvimento científico e tecnológico a longo prazo para o País. O Brasil deve investir um monte de dinheiro em astronomia e não dar dinheiro suficiente para outras áreas? Claro que não. Tudo tem de ser parte de uma estratégia integrada.
Como convencer os governos a investir em astronomia – que é uma ciência básica e cara –, quando há tantas outras coisas mais urgentes a se fazer? Por que construir um telescópio em vez de uma escola ou um hospital, por exemplo? Ou pesquisar galáxias em vez de pesquisar o câncer ou a dengue? É um argumento que se ouve muito no Brasil.
Por que investir na astronomia? Bem, porque é interessante! Porque a astronomia atiça a imaginação das crianças e é uma ótima maneira de atrair jovens para as ciências físicas. Se você olhar para as pessoas que vão se tornar os cientistas e os engenheiros do futuro, verá que foi a astronomia ou os dinossauros que as fizeram ficar interessadas na ciência em primeiro lugar. E esse envolvimento precoce é extremamente importante. Sem falar que a astronomia faz umas coisas estranhas de vez em quando. A tecnologia de Wi-Fi, por exemplo, foi inventada por um astrônomo australiano com base em técnicas que ele usava para procurar buracos-negros em evaporação. Ele não achou os buracos-negros, mas desenvolveu uma tecnologia revolucionária que vale bilhões de dólares no mundo todo.
O senhor descobriu que o universo está se expandindo de forma acelerada. O que vai acontecer com ele?
A situação é a seguinte: daqui a 100 bilhões de anos, todas as galáxias que enxergamos hoje estarão tão longe de nós que elas se tornarão invisíveis, mesmo com o uso de telescópios. As estrelas da Via-Láctea ainda serão visíveis, mas todas as outras galáxias desaparecerão. Olharemos para o universo e ele parecerá vazio. O resultado é que cosmólogos como eu ficarão desempregados, pois não haverá mais nada para olhar; restarão apenas astrônomos de estrelas e planetas (risos).
Cem bilhões de anos é um tempo inacreditável. O universo hoje tem menos de 14 bilhões! Por que devemos nos importar com isso? Por que gastar tempo e dinheiro estudando coisas que não tem nenhuma influência prática na nossa vida?
Olha, no fim das contas, fazemos astronomia pelas mesmas razões que fazemos arte e literatura. Fazemos porque somos seres humanos e queremos entender qual é o nosso lugar no universo. Por que toda a matéria que enxergamos corresponde a apenas 4,5% de tudo que existe no universo? Por que o universo continuará a se expandir para sempre e o que vai acontecer com ele e conosco? São perguntas fundamentais! Não posso prometer que nossas pesquisas vão produzir uma torradeira mais eficiente, mas acho que a maioria das pessoas gostaria de saber as respostas a essas perguntas. Os benefícios diretos da astronomia são difíceis de explicar, mas, essencialmente, a razão pela qual fazemos astronomia é para “entender”. O governo me dá dinheiro para fazer astronomia por causa dos benefícios econômicos; eu faço astronomia para entender. Por que a religião existe? Pelo mesmo motivo. As pessoas querem entender qual é o lugar delas no universo; é para isso que serve a religião e ela pode conviver com a ciência sem problemas.
Olhar para os limites do universo fez do senhor uma pessoa mais ou menos religiosa?
Eu me defino hoje como um agnóstico militante. Não sou ateu, porque ser ateu e negar a existência de Deus é algo que também exige fé, de que você pode provar a inexistência de algo. Dito isso, vou deixar claro que não sou religioso de maneira nenhuma. Sou ambivalente: eu não sei se Deus existe e não estou preocupado com isso, porque acho que é impossível saber.
O senhor imaginava ­– ou tinha expectativa — que sua pesquisa poderia valer um prêmio Nobel quando começou o projeto?
Eu cresci em Montana e no Alasca; ou seja, numa parte rural dos Estados Unidos (Schmidt tem dupla cidadania, americana e australiana). Quando entrei na Universidade do Arizona, minha expectativa era conseguir um diploma em astronomia e depois conseguir um emprego “normal”. Eu sabia que na astronomia eu aprenderia várias coisas úteis: bastante sobre física, o básico da engenharia, um pouco sobre programação, comunicação. Aí eu iria para a indústria e conseguiria um emprego para fazer alguma coisa qualquer. Para minha grande surpresa, porém, eu me saí muito melhor na universidade do que esperava, e consegui entrar para a pós-graduação em Harvard — algo muito muito além das minhas expectativas. Mas a ideia de ganhar um prêmio Nobel nunca apareceu no meu radar. Ninguém nunca me perguntou sobre isso e eu nunca sonhei com isso; era simplesmente algo que não me preocupava, porque era algo que “não acontecia com pessoas como eu”. Quando começamos nosso projeto de pesquisa, em que eu estava medindo a taxa de expansão do universo, eu tinha uma amiga bióloga de Harvard que estava no carro um dia comigo e me perguntou o que eu fazia exatamente. E ela me contou que o orientador dela dizia que ela “só deveria trabalhar com coisas que pudessem render um prêmio Nobel algum dia”. Eu lembro que dei risada e falei: “A única chance de eu ganhar um prêmio Nobel com essa pesquisa é se o universo estiver fazendo algo bem estúpido; tipo acelerando”. Mesmo assim, quando descobrimos e confirmamos que o universo estava fazendo exatamente isso, achei muito legal, mas não achei que ganharíamos o Nobel. Mas ganhamos.
  • 11/02/2013 - 12:59
    Enviado por: Aranha, P.
    Enorme lição para um País sem ciência como este.
  • 11/02/2013 - 14:36
    Enviado por: Alex
    Achei as respostas dele excelentes. Eu tambem acho que o Brasil ainda tem um longo caminho pela frente. Temos que investir na formaçao de pessoal, infra-estrutura, colaboraçoes internacionais; e é claro, manter tudo isto custa caro e os resultados nao sao imediatos. E’ um projeto que pode levar decadas, mas tem que ter continuidade. Uma estrutura de pesquisa forte tem que ser a meta, o Nobel se vier, sera’ apenas um consequencia.
  • 11/02/2013 - 18:40
    Enviado por: Carlos Magno
    Então, na opinião desse Senhor, o trabalho “dos gênios de antigamente” é atualmente “feito pelos computadores, pela tecnologia”. Que frase absurda! É inacreditável que um prêmio Nobel diga tamanha bobagem! Sendo assim, esse Senhor está dizendo que o pesquisador atual está desobrigado da necessidade de pensar! Eu, modestamente, faria mais algumas perguntas: antes da tecnologia dos computadores existia o quê? Incompetentes? Quem criou essa tecnologia? Esses mesmos incompetentes? Quanto tempo é esse “antigamente”? A mecânica quântica, que tem pouco mais de 100 anos, está incluída nesse “antigamente”?
    • 12/02/2013 - 13:31
      Enviado por: Rafael V. Cacilhas
      Ele não quis dizer isso, voce que interpretou de modo muito literal. O que ele quis dizer é que hoje raramente são feitas “grandes descobertas por uma pessoa” como a de Einstein e Plank, e sim descobertas feitas por grandes equipes de pesquisadores.
      Também discordo da parte dos computadores, só pra constar.
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    • 12/02/2013 - 14:51
      Enviado por: Alfredo
      Concordo. Dizer que “o trabalho dos gênios de antigamente hoje é feito em sua maior parte por computadores, pela tecnologia” é uma grande bobagem, típica de alguém que deve ter alguma lembrança desagradável dos tempos de estudante…
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  • 12/02/2013 - 07:53
    Enviado por: Anderson Soares
    A pergunta do repórter é pertinente. por quê a preocupação com o que vai acontecer daqui a cem milhões de anos? precisamos resolver o caso do cancer e da dengue pois isso pode impedir que cheguemos ao ano que vem ou um pouco mais, especialmente com a ajuda da corrupção, da bandidagem e outras mazelas próprias da humanidade.
    Também fica esquisito um cientista dessa matéria ainda acreditar em Deus. A meu ver o resultado das suas pesquisas, não transitem credibilidade. Como ele é bastante jovem, ainda pode mudar de profissão. Mas ganhar um Nobel com tal tese é um tanto exagerado.
    • 12/02/2013 - 13:35
      Enviado por: Rafael V. Cacilhas
      Não é pertinente não. São simplesmente coisas diferentes; voce nao pode trabalhar em diversas áreas ao mesmo tempo? Ou ninguem pode estudar enquanto existir assaltos? Ou ninguem pode assaltar enquanto existir dengue?
      A questão é que todos sabem que Ciencia é fundamental, mas poucos sabem que grande parte dos cientistas está pouco se lixando pras tecnologias que irão render do trabalho deles. Eles só querem aprender mais…
      E o que voce disse de Deus é totalmente ridículo. Sir Isaac Newton, um dos Físicos mais brilhantes da história, era extremamente religioso. As duas coisas são desconexas.
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  • 12/02/2013 - 09:30
    Enviado por: Eduardo A Bari
    A verdadeira expansão do nosso universo então, é aquela da escola pública de qualidade !!!
    A classe média alta de São Paulo por exemplo,acha que educação de qualidade é colocar o filho no Dante .KKK

    RAÍZES DO SENSACIONALISMO



    Uma das coisas que eu mais abomino no jornalismo é o sensacionalismo. No jornalismo de ciência e saúde, especificamente, é muito comum ver notícias sensacionalistas, que reportam os benefícios, malefícios, riscos ou implicações de resultados científicos de maneira exagerada; seja para o bem ou para o mal. Há muitas razões para isso. Entre elas, o despreparo de jornalistas, que muitas vezes não querem e/ou não são capazes de enxergar o sensacionalismo de seus próprios textos.
    O jornalismo e a mídia têm suas falhas. Admito, não nego e, pessoalmente, procuro evitá-las ao máximo. Mas as assessorias de imprensa, as instituições de pesquisa e os próprios cientistas também têm sua parcela de culpa, claro ­– o que não é sempre reconhecido. Muitas vezes, o sensacionalismo da imprensa nada mais é do que uma reflexão do sensacionalismo da ciência e de seus divulgadores institucionais. Assim como a imprensa vive de atrair mais leitores para sua cobertura, os cientistas e suas instituições vivem de atrair mais recursos e mais atenção para suas pesquisas.
    Assim, é comum pesquisadores, instituições e revistas científicas “sensacionalizarem” os resultados dos trabalhos que publicam. E se o jornalista não tiver competência para enxergar esse sensacionalismo, vai incorporá-lo com gosto às suas reportagens. Todo mundo fica feliz: o pesquisador e as instuições ganham prestígio e visibilidade, a revista científica coloca seu nome na mídia, o repórter atrai mais leitura para sua reportagem, o jornal vende mais jornais e os leitores ficam com a sensação confortável de que todas as doenças estão prestes a ser curadas e que a ciência resolve todos os problemas. O único problema é que isso não é verdade. A verdade é que a ciência avança a passos lentos, a grande maioria dos trabalhos publicados não trazem soluções nem respostas definitivas para nada, tem um monte de coisas ainda que a ciência não sabe, e muita gente ainda vai morrer por muito tempo de câncer, aids, malária ou seja lá o que for.
    Um estudo publicado esta semana na revista PLoS Medicine explora as raízes do sensacionalismo em reportagens sobre ensaios clínicos randomizados. O paper pode ser baixado aqui: Misrepresentation of Randomized Controlled Trials in Press Releases and News Coverage: A Cohort Study. Não vou entrar em detalhes sobre os resultados, mas a conclusão geral é que boa parte do sensacionalismo nas reportagens tem raízes no sensacionalismo de “press releases”, que por sua vez têm raízes no sensacionalismo dos próprios pesquisadores, expresso nos abstracts e nas conclusões de seus trabalhos publicados. Ou seja, todo mundo tem culpa, e todo mundo precisa melhorar.
    Abaixo, a conclusão do trabalho da PLoS Medicine e dois parágrafos de comentários feitos pelo editor (na versão original em inglês):
    Conclusion: “Spin” was identified in about half of press releases and media coverage. In multivariable analysis, the main factor associated with “spin” in press releases was the presence of “spin” in the article abstract conclusion.
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    Editor’s Summary:

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    What Did the Researchers Do and Find?

    The researchers identified 70 press releases indexed in EurekAlert! over a 4-month period that described two-arm, parallel-group RCTs. They used Lexis Nexis, a database of news reports from around the world, to identify associated news items for 41 of these press releases and then analyzed the press releases, news items, and abstracts of the scientific articles related to each press release for “spin”. Finally, they interpreted the results of the RCTs using each source of information independently. Nearly half the press releases and article abstract conclusions contained “spin” and, importantly, “spin” in the press releases was associated with “spin” in the article abstracts. The researchers overestimated the benefits of the experimental treatment from the press release as compared to the full-text peer-reviewed article for 27% of reports. Factors that were associated with this overestimation of treatment benefits included publication in a specialized journal and having “spin” in the press release. Of the news items related to press releases, half contained “spin”, usually of the same type as identified in the press release and article abstract. Finally, the researchers overestimated the benefit of the experimental treatment from the news item as compared to the full-text peer-reviewed article in 24% of cases.
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    What Do These Findings Mean?
    These findings show that “spin” in press releases and news reports is related to the presence of “spin” in the abstract of peer-reviewed reports of RCTs and suggest that the interpretation of RCT results based solely on press releases or media coverage could distort the interpretation of research findings in a way that favors experimental treatments. This interpretation shift is probably related to the presence of “spin” in peer-reviewed article abstracts, press releases, and news items and may be partly responsible for a mismatch between the perceived and real beneficial effects of new treatments among the general public. Overall, these findings highlight the important role that journal reviewers and editors play in disseminating research findings. These individuals, the researchers conclude, have a responsibility to ensure that the conclusions reported in the abstracts of peer-reviewed articles are appropriate and do not over-interpret the results of clinical research.

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    12.fevereiro.2013 13:43:43

      Marcelo Rubens Paiva

    vou te apresentar uma amiga incrível

    O homem desiludido, abandonado e traído, que vaga solitário pelos calçada deserta, prefere a sombra da pequena aglomeração, cruza a pista de dança só para ir ao banheiro, que só vai a bares com balcão, para assistir aos efeitos do aquecimento global nos gelos do próprio copo, sente falta do amigo cigarro, proibido em ambientes fechados, para se esconder atrás da fumaça banida como uma usina nuclear soviética, que no supermercado seleciona as menores porções, a meia garrafa, uma meia dúzia, que nem liga o som quando chega em casa, quiçá abre um vinho para jantar sozinho, percebeu que ele é uma commodity valiosa, o cara disponível, o amigo separado, mas faz pouco para se promover nas operações da bolsa de mercadoria futura.
    O que este sujeito mais escutou no tempo em que durou seu celibato forçado, vítima do estado de desânimo relacionado a uma redução na transmissão de impulsos e sinais nervosos em regiões do cérebros que regulam o humor, depois de que aquela ingrata cujo nome recusa a falar o largou, foi:
    Vou te apresentar uma amiga incrível!
    Se a frase foi proferida por outro cara, ele certamente é casado, pois jamais apresentaria uma amiga bacana, gostosa, muito menos incrível ao separado cobiçado. Ficaria para si, como a riqueza de um subsolo. Ela seria estatizada num monopólio sem concessões. E se for apresentada, é porque ela talvez tenha um defeito incrível e está sendo passada adiante.
    Se a frase foi proferida por uma amiga, terapeuta, médica, gerente de fundo de investimentos, advogada da separação, colega de pilates, mãe de santo ou a ex de quem você consegue pronunciar o nome, pode acreditar que a amiga não é tão incrível.
    Se disse “vou apresentar uma amiga linda”, ela é linda para a amiga, invejada em academias, mas que não dialoga com a libido hibernada entre glândulas espalhadas pela alma e corpo masculinos. Dificilmente o que é bonito para uma mulher o é para um homem. O que é atraente, irresistível e digno de ser apresentado a um amigo disponível carrega as qualidades de que a amiga gostaria para si.
    “Vou te apresentar uma amiga que é uma gata!”
    Raramente é uma gata. E, se for, será descoberta no primeiro encontro a intolerância dela a frutose, glicose, sacarose e glúten. Não come carne ou alimentos que têm olhos ou vêm crus. Não bebe, não fuma, não dirige, sem contar que mora num bairro do qual você nunca ouviu falar, acha Tarantino excessivamente violento e é da torcida organizada do time rival. Gata. Olhos lindos. Em forma, já que não come nada e pula sem parar em arquibancadas de estádios da primeira e segunda divisão. Porém…
    O que as mulheres não sabem é que o gosto masculino não segue um padrão randômico, nem pode ser comparado ao diálogo num balcão do açougue. Tem lógica, sutilezas e romantismo. Duvida?
    A prima – A primeira paixão, apesar do tabu. Nunca se determinou se na prima está oculto o desejo reprimido do incesto. Da boneca da irmã arrancamos a cabeça. A da prima, consertamos. O diário da irmã, queimamos. O da prima, fuçamos. Dos namorados da irmã, ficamos até amigos. Dos da prima, invejamos, depomos contra, acusamos. Os cabelos da irmã são um tormento, entopem ralos e pias. Os da prima, são lindos e sedosos. A irmã rouba nossa roupa. A prima pega emprestada. Mas é uma fantasia confusa, como uma primeira paixão deve ser.
    A Bandeirante – O primeiro amor, se do ramo guia ou dirigente. Sempre alerta! Diz o juramento: “Ser Bandeirante é merecer confiança, ser leal e respeitar a verdade, servir ao próximo em todas as ocasiões, valorizar a estima e a amizade, ser amável e cortês, preservar a natureza, saber obedecer, enfrentar alegremente todas as dificuldades, usar os recursos com sabedoria, agir, pensar e ser coerente com os valores éticos.” Quer mais? O uniforme? Tênis surrado, meias brancas até um dedo abaixo dos joelhos, saia de brim azul, abotoada na frente, com gola em vê e lenço. Carregam no peito estrelas, broches com mapas, símbolos misteriosos. Na manga esquerda, tags costurados (patch scout) indicam as especialidades: fogueira (acende o fogo com elementos da natureza), primeiros socorros (quais seriam estes?). São alegres, só fazem o bem, convivem com a natureza, praticam a vida ao ar livre e o trabalho em equipe. Lema: incentivar o conhecimento de novas culturas, estabelecer um senso crítico e proporcionar um desenvolvimento criativo. Se um asteroide se chocar contra a terra, é ao lado de uma que você gostaria de estar.
    Tenista do Leste Europeu – Pode ser russa, bielorrussa, ucraniana. Segura uma raquete como se empunhasse uma AK-47. Com sua saia provocante, não esconde as pernas longas, torneadas, bronzeadas. Joga com raça e determinação, como se defendesse o cerco de Leningrado. Camarada alta, forte, grita em cada jogada, nos obrigando, amantes platônicos, a instalar janelas antirruído antes de convidá-la para uma vodca com frango a Kiev. Alguma amiga apresenta uma atleta eslava?
    Vizinha do Bloco B – Quem será? Passa correndo e nem repara em você. Nunca se encontrarão no elevador, pois você mora no Bloco A. Não aparece na piscina nem nas reuniões do condomínio, como se fosse heresia se socializar com a vizinhança. Nunca está na fila da entrega da pizza de domingo. Nem o porteiro sabe seu nome. Sempre tem pressa. Estaciona, aciona o alarme, carrega pacotes sem pedir ajuda. Mora sozinha, e semanalmente a buscam ou a deixam na porta do prédio; sempre é um cara diferente. Não adianta procurar de luneta pelas janelas do Bloco B. Você verá o seu síndico nu dançar um tango com o rodo. Jamais a vizinha misteriosa.
    Gordelícia – Calma lá, patrulha! Reflita antes de iniciar o julgamento. Não se fere códigos de conduta nem há resquícios de preconceito neste termo. Ao contrário. Para as colegas, a gordelícia está gorda! Deve ser combatida e evitada. No entanto o mundo masculino a venera. Não considera gorda, mas fora de forma, uma delícia. Uma resistência à ditadura da bulimia que enxuga as mulheres. É a garota Canal Brasil, que mexe com os arquétipos do desejo renascentista impregnado no inconsciente coletivo. É aquela que tem onde nos segurarmos e o que pesquisar com nossos seis sentidos, que geralmente, por ser discriminada, além de deliciosa, é divertida.

    +++

    São elas gordelícias ou delícias que desprezam o padrão imposto e por vezes ficam mais saudáveis, fortinhas [como dizem minhas tias italianas], graças a deus…?








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