terça-feira, 30 de abril de 2013

Lucas Mendes: Mi carro es su carro



Lucas Mendes: Mi carro es su carro

Lucas Mendes

De Nova York para a BBC Brasil


O correto seria "coche", mas hoje nós vamos de carro.

Nos avançadíssimos Estados Unidos, as primeiras experiências com carros divididos no cotidiano foram na década de 90. Na Suíça já existiam 600 organizações oferecendo o mesmo serviço, mas o que acontece na Suíça raramente se repete fora da Suíça, uma civilização muito mais avançada.

A primeira vez que li uma matéria sobre empresas que alugavam carros por minuto, hora e dia, foi há uns dez anos. A ideia era tão lógica e prática que liguei para comprar meia dúzia de ações. Não estavam à venda no mercado.

Agora, estão em mais de vinte cidades americanas, com quase um milhão de associados, um salto de 40% desde o ano passado. E quem menos comprou carros deste 2007? A geração Y, a nova, dos 18 aos 34. Entre eles, a queda nas vendas foi de 30%.

Dos meus três filhos, nenhum tem carro nem quer comprar. Dois não tem nem carteira, um nunca aprendeu a dirigir.

Eu fiquei 10 anos sem carro e sem sentir falta dele, mas desde a década de 90 comecei a fazer "leases" porque a equipe usava o carro para reportagens durante o dia e eu o usava nos fins de semana. Para quem dirige menos de 12 mil milhas por ano, 19.200 quilômetros, fazer lease sai mais barato do que comprar.

"Vou economizar uma baba e ficar mais sadio com caminhadas e bicicletadas."

E a tortura da compra de um carro novo? Escolher entre dezenas de modelos, cor exterior e interior, couro ou plástico, potência, consumo de gasolina, bagulhos eletrônicos, som, GPS. O seguro, a garagem, a gasolina. As preferências da mulher.

E a malandragem do vendedor? O preço nos anúncios sobe de US$ 300 para US$ 500 por mês quando você vai à revendedora. Um dos vendedores mais espertos que encontrei foi um mineiro, vizinho de bairro em BH, adorável, jazzista. Que talento para enganar os amigos.

Depois da experiência com ele, passei a fazer leases com a condição de não ter que falar com o vendedor. Escolhia ao carro e os detalhes pela internet, ligava e marcava a hora para assinar o contrato. No fim do lease, em geral de três anos, ligava e pedia outro carro igualzinho. Entrava , devolvia o velho e em 20 minutos saia com o novo da revendedora.

Estou no meu último carro. Quando o contrato terminar ano que vem, vou aderir ao carro por minuto, por hora ou por dia. E às milhares de bicicletas coletivas que vão chegar em maio.

Vou economizar uma baba e ficar mais sadio com caminhadas e bicicletadas.

Tenho um amigo de 71 anos que vendeu a empresa dele por US$ 125 milhões. Só anda de bicicleta e metrô. A dele é uma destas minis, dobráveis. Chega nos encontros para discutir milhões de capacete, a mini debaixo de um braço e a pasta noutro ombro. Antigamente, provocava espanto. Hoje, costuma encontrar outro ciclista milionário na mesa.

Bicicleta não funciona no inverno e mal na chuva. Há várias opções de aluguel de carros e hoje entrei para duas, Zipcar e Relayrides.

Na Zipcar você paga uma taxa de inscrição de US$ 60, em menos de dez minutos preenche o formulário e meia hora depois chega a confirmação. O cartão magnético que abre os carros vem pelo correio em dois ou três dias.

Dependendo do modelo, o carro pode custar menos de US$ 20 por hora. Nos feriados e fins de semana convém reservar com antecedência.

Relayrides é uma espécie de ação entre necessitados que não se conhecem. Entrei no site e, em menos de cinco minutos, mais 30 carros estavam à minha disposição a menos de 10 minutos. Mercedes 2012 por US$ 19 a hora ou US$ 80 por dia. BMWs um pouco mais antigos por US$ 10 a hora. Você encontra o modelo que você quiser por preços que não acredita.

Há quem compre carro para alugar e muitos donos colocaram os deles na praça. Pelas pesquisas, o carro fica à toa 92% do tempo.

Hoje um bilhão de carros estão nas encruzilhadas globais e pela voracidade dos consumidores emergentes, serão dois bilhões daqui a sete anos. Um caos imundo e infernal. Pequim, México e São Paulo estão entre as cidades com ares mais envenenados.

As indústrias de automóveis e petróleo com seus trilhões de dólares e milhões de empregos não vão quebrar nos próximos cinco anos, mas aquele carro que era o sonho dos jovens, símbolo de status, possuído por egoísmo, engraxado com carinho e exibido com peito estufado, vai virar transporte coletivo. O carro é meu, é seu, é dele, é nosso. Os emergentes um dia chegam lá.

Escreva Lola Escreva: GUEST POST: AS PESSOAS SÃO CRUEIS COMIGO POR CAUSA...

Escreva Lola Escreva: GUEST POST: AS PESSOAS SÃO CRUEIS COMIGO POR CAUSA...: A R. me enviou este relato que destruiu meu coração em pedacinhos e depois tacou fogo. Foi coincidência porque recebi o relato pouco depo...

E por falar em crianças...Boudokan



E por falar em crianças...


Amigo, não se engane!

Você é livre enquanto não ameaça o sistema.

Vivemos num mundo onde os novos escravos são as crianças. Uma em cada três vive sob a servidão do lucro e da exploração. São crianças que nunca ouviram falar em infância, não freqüentam escola e ignoram o lazer. São míseras peças de uma engrenagem que idolatra a mais-valia.

A esperança para elas é uma quimera.

Esse é o mundo perfeito do capitalismo.

E essas crianças ainda são privilegiadas diante do horror que a “civilização ocidental” representa.

No Iraque, por exemplo, a Cruz Vermelha Internacional informa que registrou a prisão de mais de cem crianças, a maioria delas em Abu Ghraib.

E nessa mesma prisão o jornalista Seymour Hersh, do New Yorker, primeiro jornalista a denunciar as torturas praticadas pelos soldados americanos, declarou durante uma palestra que assistiu a tapes “onde podíamos ver as crianças sendo sodomizadas.

O pior de tudo era ouvir seus gritos”, ressaltou.

Sodomia de crianças é a última manifestação da “democracia de exportação”.

Essa mesma democracia que fala em liberdade de imprensa, mas não permite que essas verdades sejam divulgadas.

Crianças com 8 anos de idade servindo a apetites medonhos de alienígenas que invadiram seu país para aumentar os lucros de empresas.

Amigo, não se engane!

O capital é isso. Vive da posse e da exploração do alheio. Nem que para isso seja necessário invadir países, assassinar populações e estuprar crianças.

Hoje, a miséria é a principal transmissora de doenças e epidemias já extintas.

Graças a esse sistema, vivemos numa sociedade onde o individualismo é levado ao extremo.

O homem deixou de ser um animal social, para se transformar num ser solitário, triste e egoíst

Nem amigos, nem vizinhos, apenas solidão.

Esse sistema seja qual for a fé, governa a matéria e o espírito.

Transformou o ser humano num animal cruel, contra si e contra os outros.

O capitalismo matou os anjos. Hoje, são os demônios que falam em nome de Deus.
Pobres semitas - antes, os arianos, agora, os israelianos

http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=ASckvf_xa24

Sul 21 » Apesar de críticas, Tarso Genro assina convênio com empresa militar israelense

Sul 21 » Apesar de críticas, Tarso Genro assina convênio com empresa militar israelense

segunda-feira, 29 de abril de 2013

The Vermont Manifesto




empire imperial rebel
Do Citizens Have a Right to Control Their Own Lives?
Vermont citizens

The Vermont Manifesto

If your nation is making itself into a big target for hate, and if its apparent priorities run counter to your values, would you consider rebelling or seceding? What if your very survivial depended on it?

Here is an interesting article, reprinted last summer by the Texas Observer after originally running in "Vermont Green Mountains - A Voice."

by Thomas H. Naylor
A specter is haunting America -- the specter of technofascism -- a global system of imperialism in which ostensibly free individuals allow Corporate America and the United States government to manipulate and control their lives through money, markets, media, and technology, resulting in the loss of political will, civil liberties, and traditional culture.

We the people of Vermont believe the United States of America has become too big, too powerful, too intrusive, too materialistic, too high-tech, too globalized, too militarized, too imperialistic, too violent, too undemocratic, and too unresponsive to the needs of individual citizens and small communities. National and Congressional elections are bought and sold to the highest bidder. State and local governments aasume too little responsibility for the solution of their own social, economic, and political problems, willingly abdicating their responsibilities.

Our nation suffers from megalomania -- an obsession with personal power, influence, grandeur, and wealth and the obsessive-compulsive worship of anything that is big -- big government, big cities, big business, big schools, big science, big weapons, big computer networks, and big political unions.

Transnational megacompanies, accountable to no one, tell us what to buy, how much to pay, and when to replace it.They tell us where we can work, how much we will be paid, and what our working conditions will be.

The World Trade Center was the shrine of globalization, where believers paid homage to the international system of mass production, mass market- ing, mass distribution, mass consumption, mega financial institutions, and global telecommunications -- a system which works best if we are all the same. But too often globalization was achieved through coercion, exploitation, collectivism, monopoly, and American military might.

American foreign policy is based on the premise that political, economic, technological, and military might make right. Our history differs little from that of any other empire. It is rooted in imperialism toward Native Americans, African Americans, and nations that got in its way. Since the end of World War II, the U.S. has intervened in the affairs of 22 countries, and none of these interventions was preceded by a declaration of war.

As the nihilistic war on terrorism expands, it's just a matter of time before the Pentagon reinstates compulsory military service. How many Vermonters are prepared to die or sacrifice their children to make the world safe for McDonald's, Wal-Mart, 747s, gas guzzling SUVs, the internet, Bill Gates, and the rest of the Forbes 400 richest Americans?

The U.S. runs the risk of "imperial overstretch" in which the sum of our nation's global commitments exceeds its power to defend them all simultaneously. Not unlike the Roman, Ottoman, Spanish, Napoleonic, British, and Soviet empires, the American Empire could be brought down by a leaching away from within rather than by an external threat.

Fine tuning our badly crippled nation will do little to turn it around. There is only one solution to the problems of America-peaceful dissolution, not piecemeal devolution.

Many Vermonters view the American Way of Life through a jaundiced eye -- affluenza, technomania, corporate welfare, the militarization of space, and pandering to the rich and powerful. They are disillusioned with America's hubris and concupiscence and long for a quieter, simpler, less materialistic, more fulfilling life.

Vermont minds its own business. It has no military bases, no cities, no big government installations, and virtually no strategic industries. Not unlike Norway, Denmark, Sweden, and Switzerland, Vermont is a threat to no one. Why would anyone invade Vermont? What would they do with it?

Vermont has little in common with Boston, New York, Houston, Los Angeles, or Chicago. It has much more in common with Maine, New Hampshire, and the four Atlantic provinces of Canada. Why should Vermonters be taxed to pay for the military protection of New York City, the epicenter of global capitalism and corporate greed, or Washington, D.C., the vapid capital of the Empire? How can it avoid a global class war between the haves and the have-nots?

There are no quick-fix solutions to our problems of bigness and lack of connectedness -- no substitutes for empowering, nurturing, and supporting small communities. Community building is a slow and arduous process.

As Thomas Jefferson said in the Declaration of Independence, "Whenever any form of government becomes destructive, it is the right of the people to alter or abolish it, and to institute a new government." An empire by secession can surely die that way.

We believe the time has come for all citizens of Vermont peacefully to rebel against the Empire by (1) regaining control of their lives from big government, big business, big cities, big schools, and big computer networks; (2) relearning how to take care of themselves by decentralizing, downsizing, localizing, demilitarizing, and humanizing their lives; and (3) learning how to help others take care of themselves so that we all become less dependent on big business, big government, and big technology.

We the citizens of Vermont peacefully and respectfully call for a statewide convention of democratically elected representatives to consider one and only one issue -- the withdrawal of Vermont from the United States of America and a return to its status as an independent republic as was the case in 1791. Once the declaration of secession has been approved by a two-thirds majority, Vermont's governor will be empowered to negotiate a separation agreement with the U.S. Secretary of State.

In the world of global terrorism, any state remaining in the U.S. runs the risk of terrorist attack as well as military conscription for Its youth. Secession is no longer just an idle libertarian threat, but a path for survival. The time has come to confront the reality of disunite or die.

How Thomas Herndon, a student, took on Harvard economists and won in http://ibnlive.in.com/




How Thomas Herndon, a student, took on Harvard economists and won
| Posted on Apr 18, 2013 at 01:31pm IST

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New York: When Thomas Herndon, a student at the University of Massachusetts Amherst's doctoral program in economics, spotted possible errors made by two eminent Harvard economists in an influential research paper, he called his girlfriend over for a second look. As they poured over the spreadsheets Herndon had requested from Harvard's Carmen Reinhart and Kenneth Rogoff, which formed the basis for a widely quoted 2010 study, they spotted what they believed were glaring errors.

"I almost didn't believe my eyes when I saw just the basic spreadsheet error," said Herndon, 28. "I was like, am I just looking at this wrong? There has to be some other explanation. So I asked my girlfriend, 'Am I seeing this wrong?'" His girlfriend, Kyla Walters, replied, "I don't think so Thomas."

In the world of economic luminaries, it doesn't get much bigger than Reinhart and Rogoff, whose work has had enormous influence in one of the biggest economic policy debates of the age. Both have served at the International Monetary Fund. Reinhart was a chief economist at investment bank Bear Stearns in the 1980s, while Rogoff worked at the Federal Reserve, passing through Yale and MIT before landing at Harvard.

How a student took on Harvard economists over errors and won

Harvard Professor and Economist Kenneth Rogoff

Their study, which found economic growth slows dramatically when a government's debt exceeds 90 per cent of a country's annual economic output, has been cited by policymakers around the world as justification for slashing spending.

Former US vice presidential candidate Paul Ryan, a Republican congressman from Wisconsin, is one influential politician who has cited the report to justify a budget slashing agenda. Using the two professors' data, Herndon found that instead of a dramatic fall in growth, the decline was much milder, slowing to about 2.2 per cent, instead of the slump to minus 0.1 per cent that Reinhart and Rogoff predicted.

Things tend to move at a glacial pace in the world of academic research papers, but within 24 hours Herndon and his two teachers, who co-authored the report, Michael Ash and Robert Pollin, found themselves swept up in a global debate. Herndon's paper began life as a replication exercise for a term paper in a graduate econometrics class. He expected to replicate Reinhart and Rogoff's results, then challenge the idea that high public debt caused growth to slow. But he never got that far. Repeated failures to replicate the results roused his interest. Pollin and Ash encouraged him to pursue it after he convinced them he was onto something.

"At first, I didn't believe him. I thought, 'OK he's a student, he's got to be wrong. These are eminent economists and he's a graduate student,'" Pollin said. "So we pushed him and pushed him and pushed him, and after about a month of pushing him I said, 'Goddamn it, he's right.'"

Herndon approached Reinhart and Rogoff earlier this year for the spreadsheets they used in their paper. The two professors provided them at the start of April, unlocking the mysteries of the data that had stumped Herndon. Herndon said only 15 of the 20 countries in the report had been used in the average. He also said Reinhart and Rogoff used only one year of data for New Zealand, 1951, when growth was minus 7.6 per cent, significantly skewing the results.

Reinhart and Rogoff have admitted to a "coding error" in the spreadsheet that meant some countries were omitted from their calculations. But the economists denied they selectively omitted data or that they used a questionable methodology.

For Ash, the findings mean the claim that high public debt causes growth to stall no longer holds water. "Their central thesis has been substantially weakened," he said. Reinhart and Rogoff, however, say their conclusion that there is a correlation between high debt and slow growth still holds. "It is sobering that such an error slipped into one of our papers despite our best efforts to be consistently careful," they said in a joint statement. "We do not, however, believe this regrettable slip affects in any significant way the central message of the paper or that in our subsequent work."

Now that Herndon has ably crossed swords with some of the most eminent figures in his field, he is thinking about expanding his work into a Ph.D. thesis.

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Luiz Claudio Cunha – Mujica, o presidente guerrilheiro, esmaga juíza que enfrenta torturadores da ditadura
Mariana Mota, a juíza… e o presidente, José Mujica

Mariana Mota, a juíza… e o presidente, José Mujica

Por Luiz Claudio Cunha(*)

Feche os olhos e imagine a seguinte tragédia em três atos:

Ato 1. A presidente Dilma Rousseff, ex-guerrilheira e presa política, é pressionada por oficiais ligados à linha dura do regime militar, irritados com o juiz de São Paulo que reconheceu a morte sob torturas do jornalista Vladimir Herzog nos porões do DOI-CODI do II Exército, durante a ditadura.

Ato 2. A presidente Dilma Rousseff cede à pressão dos quartéis, procura uma revista semanal e cobra publicamente uma reação do Supremo Tribunal Federal contra o magistrado incômodo.

Ato 3. Submisso, o STF acata a queixa do Palácio do Planalto e pune o juiz, que acaba inesperadamente removido para um inofensivo tribunal de causas menores, sem envolvimento com direitos humanos, reforçando a blindagem dos torturadores e assegurando a impunidade aos crimes de lesa-humanidade.

Agora, abra os olhos porque esse drama, é claro, não aconteceu no Brasil.

Mas acaba de assombrar o Uruguai, que chega ao fundo do poço de uma guerra aparentemente perdida na área crucial dos direitos humanos, graças a um personagem até então insuspeito: o ex-líder da guerrilha Tupamaro, o ex-preso político e atual presidente da República, José Pepe Mujica.

Na preguiçosa Quarta-Feira de Cinzas (13), os cinco ministros da Suprema Corte de Justiça (SCJ) do Uruguai aproveitaram a ressaca de um país relaxado pelo Carnaval para aplicar o mais duro golpe na luta contra a impunidade e a tortura no Uruguai, que padeceu por 12 anos sob a ditadura de 1973-1985.

Reagindo ao dedo rígido e à língua venenosa de Mujica, os juízes supremos em Montevidéu removeram a juíza Mariana Mota, de repente, do Juizado Penal de 7º Turno, que nos últimos quatro anos sob sua valente direção transformou-se no tribunal mais importante do país na área dos direitos humanos.

A magistrada mais conhecida e temida do Uruguai foi transferida para um inócuo juizado civil, onde não poderá mais alcançar os repressores que estremeciam diante dessa mulher esguia, de cabelos castanhos curtos, pele clara e ar tímido, que prefere roupas despojadas e esportivas à vestimenta formal e descolorida das juízas mais conservadoras.

Os óculos de leitura de aros finos não escondem o olhar doce, mas firme, dessa uruguaia de fala mansa, casada, com três filhos (entre 13 e 15 anos) que aparenta ser bem mais jovem do que os 40 e poucos anos que tem.

O riso dos dinossauros

Apesar da discrição, que explica sua aversão a fotos, Mariana Mota tornou-se a cara mais visível e valente da Justiça uruguaia, o que justifica a comoção pública provocada por sua inesperada remoção da linha de frente do Judiciário.

Na sexta-feira, quando ela se apresentou na sede da Suprema Corte, no centro de Montevidéu, para conhecer seu novo destino burocrático, o prédio apertado foi invadido por 300 manifestantes que protestavam pela decisão arbitrária. Eram estudantes, avós, mães e filhos de torturados e desaparecidos políticos e organizações de direitos humanos, inconformados com a destituição de Mota. “Suprema Corte de Injusticia”, bradavam os manifestantes, entre eles o músico Daniel Viglietti (versão local de Chico Buarque dos tempos de protesto) e o escritor Eduardo Galeano. A polícia foi chamada para evacuar o prédio e permitir o ato de posse de Mota em seu novo juizado civil.

Pairava no ar um pesado sentimento de orfandade diante das violências ainda mal apuradas do Estado, até agora sob a mira certeira da juíza destituída. O constrangimento generalizado pela violência cometida pelos senhores da Suprema Corte ficou evidente até no ministério do ladino presidente Mujica. O seu chanceler, Luís Almagro, não se valeu de mesuras diplomáticas para definir de pronto: “Mariana Mota é uma juíza extraordinária, que está próxima do ideal que se pretende do direito e da justiça”. Naturalmente preocupado com a repercussão no mundo que Mujica desprezou, o ministro de Relações Exteriores reconheceu: “O Uruguai perde posicionamento internacional com a remoção. Mota é o membro do Poder Judiciário que mais cabalmente entendeu a dimensão do tema dos direitos humanos e da vigência das convenções internacionais”.

Com uma contundência que deve ter machucado o fígado de Mujica, Almagro ainda cutucou: “Perdem as vítimas. Haverá dinossauros contentes, mas é importante que se reconheça com firmeza o trabalho realizado por Mota, para dar um sinal aos futuros Mariana Mota de que é importante que se faça este trabalho”.

O crime continuado

Os dinossauros estavam inquietos porque, sob a responsabilidade de Mota, estavam sendo investigados 55 casos de homicídios, desaparecimentos e torturas, concentrada nela mais da metade dos mais importantes processos do Judiciário envolvendo as maiores autoridades do Uruguai sob o regime militar. Os juízos mais candentes da ditadura acabavam naturalmente sugados pela corte de Mota porque eram derivados do processo-mãe contra o ex-presidente Juan María Bordaberry, o civil que se dobrou aos militares, em 1973, para fechar o Congresso e mergulhar o país na treva da violência.

Quando Mota desembarcou no Juizado Penal de 7º Turno, em março de 2009, encontrou na mesa um volumoso processo da juíza antecessora denunciando Bordaberry pelo crime de homicídio, a partir dos casos de 19 desaparecidos. Com a ajuda da promotora Ana Maria Telechea, Mota provocou uma brilhante guinada no caso, reformulando a denúncia para crime de desaparecimento forçado, o que ajustava o processo à jurisprudência das cortes internacionais.

Com base numa lei de 2006, Mota emparedou Bordaberry com a fórmula do crime continuado: invertendo o ônus da prova, no caso de homicídio, cabia ao ex-presidente demonstrar à Justiça que as vítimas estavam vivas. “O desaparecimento forçado é um delito de execução permanente. Ele continua sendo cometido no tempo até que se determine o destino do detido-desaparecido e apareça o detido ou seus restos. Nestes casos, dado o longo tempo transcorrido, trata-se da aparição de seus restos. Executando-se de forma continuada no tempo, [o crime] se qualifica como desaparecimento forçado”, explicou Mota, justificando a denúncia.

Bordaberry não conseguiu provar sua inocência e, em fevereiro de 2010, a juíza condenou o ex-presidente por 11 crimes de lesa-humanidade (nove desaparecimentos e dois homicídios). E agregou, de forma inovadora, outra denúncia, acusando o réu pelo delito de atentado à Constituição, a partir do fechamento do Congresso e a instauração da ditadura. Total da pena: 45 anos de prisão. No mês seguinte, março, a promotora Mirtha Guianze pediu outros 30 anos de prisão pelos assassinatos em 1976 do senador Zelmar Michelini e do deputado Héctor Gutiérrez Ruiz, políticos uruguaios exilados em Buenos Aires e vítimas da Operação Condor. Bordaberry só não cumpriu a pena porque morreu antes disso, em julho de 2011, aos 83 anos.

Reféns da ditadura

O desfecho do caso Bordaberry alarmou os grandes sáurios da repressão uruguaia – e, surpreendentemente, suas vítimas mais notórias. A juíza Mota preparou o bote sobre o caso de Antonio Viana Acosta, um militante Tupamaro sequestrado em Buenos Aires, em 1974, e levado clandestinamente para o Uruguai. No quartel de Rocha, foi pessoalmente torturado pelo general Gregório Alvarez, que seria o último presidente da ditadura, uma década depois.

Além do general, Mota queria duas testemunhas centrais, velhos companheiros de guerrilha de Viana: o presidente Mujica e seu ministro da Defesa, Eleutério Fernandez Huidobro. Ambos passaram 14 anos na prisão, como ‘reféns’ dos generais, para coibir ações dos Tupamaros.

Em 2010, Mota avançou o sinal: decretou a prisão e a abertura de processo contra o coronel Carlos Calcagno, chefe do Serviço de Contrainformação do Exército, acusado por torturas e o desaparecimento forçado de dois militantes da esquerda uruguaia, refugiados no Paraguai. Agindo em conexão com militares da Argentina, no âmbito da Condor, Calcagno decidiu o destino dos dois uruguaios numa reunião com a Junta de Comandantes em Chefe das Forças Armadas, em Montevidéu, em 30 de abril de 1977, segundo a detalhada denúncia de Mota. Calcagno aguarda na prisão, no Uruguai, um pedido de extradição da Justiça paraguaia.

Em abril de 2012, a juíza promoveu uma inédita acareação entre um general, Pedro Barneix, e quatro coronéis da reserva – José Baudean, José Puigvert, Washington Perdomo e Rubens Bonjour. Todos envolvidos na prisão de um cidadão, Aldo Perrini, sequestrado na cidade de Carmelo, em fevereiro de 1974, e morto dias depois sob tortura no quartel do Exército em Colônia. Acareados diante de Mota, os militares entraram em forte contradição, todos alegando a mesma e cínica surpresa com o súbito “desmaio” de Perrini sob interrogatório. Não souberam, contudo, explicar o laudo da autópsia, obtida pela juíza, mostrando os fortes e eloquentes hematomas espalhados pelo corpo.

A imprensa, enfim, acabou dando o fermento que faltava para escancarar a crise entre a juíza Mota e os seus inquietos inimigos, dentro e fora do governo Mujica. Em Buenos Aires, participando de um seminário internacional sobre crimes de lesa-humanidade, Mota concedeu uma franca entrevista ao jornal Página 12, na edição de 19 de março de 2012, que provocou tremores na outra margem do Rio da Prata. “Uruguai passou a ter o mais alto nível de presos políticos per capita da América Latina. Segundo um informe da Anistia Internacional, um de cada 50 uruguaios havia sido detido para interrogatório”, lembrou a juíza. Ela cutucou diretamente o dinossauro de Mujica quando perguntada sobre o apoio do governo uruguaio ao processo de Verdade e Justiça. Atacou Mota:

“Não há uma promoção dos direitos humanos para que esta situação, que é nacional e nos marcou a todos, se esclareça. É bem diferente do Governo argentino nessa matéria. Mujica e o ministro da Defesa (Fernandez Huidobro) foram reféns da ditadura. Talvez por isso não possam ver com objetividade um processo ditatorial que os teve como vítimas”, provocou, fazendo a distinção entre Mujica e Cristina Kirchner.

O golpe mais duro, contudo, veio na última resposta, atingindo diretamente os militares, que se mostraram ainda mais ofendidos do que Mujica. O Página 12 perguntou à juíza o que ela percebia no testemunho das vítimas ouvidas na Justiça: “As relações antagônicas entre pais e filhos. O destroçamento psíquico que ficou em cada sobrevivente, porque esta foi a intenção deliberada dos militares quando não os matavam. O processo penal uruguaio é lento. Testemunhar depois de tantos anos permite às vitimas liberar-se de uma carga emocional muito grande”.

A biografia esmagada

Surpreendentemente, a réplica não partiu dos dinossauros fardados, mas de sua pretensa vítima, um ex-guerrilheiro, o civil mais graduado do país – o presidente da República. Com cálculo político, Mujica procurou dias depois o semanário Búsqueda para acusar sem dizer, cobrar sem pedir, retaliar sem vestir a carapuça. Na edição de 29 de março da revista, Mujica finge surpresa com a falta de reação à dura entrevista da juíza em Buenos Aires: “Me chamou a atenção que nem a Suprema Corte de Justiça, nem nada parecido, se tenha pronunciado sobre o fato. Vou esperar para ver o que acontece, ver se haverá naturais manifestações após estas declarações. Até agora, porém, não houve nada”, choramingou o presidente.

A SCJ já sabia do recado e do reclamo. Quatro dias antes, na segunda-feira, 26, a Suprema Corte havia solicitado a Mota a confirmação, por escrito, de sua explosiva entrevista. Os dinossauros começaram a se alegrar. Um dos mais alegres era o ministro da Defesa, Huidobro, o ex-refém Tupamaro que entrou em conflito aberto com Mota no terreno minado dos direitos humanos. Em setembro passado, Mota fez uma diligência com escavações no quintal do Batalhão de Infantaria nº 13, conhecido como El Infierno, na esquina da avenida de Las Instrucciones com a bulevar Batlle y Ordóñez. Era sede do ‘300 Carlos’, a unidade de repressão do OCOA (Organismo Coordinador de Operaciones Antisubversivas), o braço da Operação Condor no Uruguai, o mais temido centro de torturas do país. Ali, entre tantos outros, foram supliciados em dezembro de 1978 os uruguaios Universindo Rodríguez Díaz e Lilian Celiberti, sequestrados 24 dias antes em Porto Alegre pela conexão binacional Brasil-Uruguai da Condor.

Na parte dos fundos de El Infierno estão os galpões do Serviço de Material e Armamento (SMA), outro alvo de denúncias como local de desova de cadáveres. Quando Mota e sua equipe de escavação tentaram rastrear o local, foram proibidos por Fernandez Huidobro – e o Ministro da Defesa ganhou em troca uma denúncia de desacato à ordem judicial.

A juíza Mota, com certeza, não tinha um futuro promissor com tantos inimigos em volta, dentro e fora do governo. A aliança de ferro entre velhos dinossauros militares e antigos guerrilheiros Tupamaros, subitamente juntos contra uma única e solitária juíza, surpreendeu e chocou a opinião pública, dentro e fora do Uruguai. Vergonhosamente, até a outrora combativa Frente Ampla, a maior força política do país, criada em 1971 justamente para resistir à ditadura e que hoje reúne 16 partidos, grupos e movimentos de esquerda e centro-esquerda, calou-se submissa diante do massacre comandado por seu maior líder, o presidente Mujica.

Dona de 50 das 99 cadeiras da Câmara dos Deputados e de 16 das 30 cadeiras do Senado, a enfatuada Frente Ampla encolheu-se de forma deprimente, abjurando as bandeiras de resistência às violações de direitos humanos que a brava juíza Mariana Mota agora desfralda, solitária, contra aqueles que um dia foram os inimigos de sangue de Mujica e sua gente.

Essa negação de princípios políticos e éticos que eram marca da Frente Ampla no seu passado de luta pode ser medida matematicamente em Montevidéu, o maior e mais evoluído centro político do país, onde moram mais de um terço dos 3,4 milhões de habitantes do país. Nas últimas duas décadas, a partir de 1989, a Frente Ampla sempre ganha as eleições ali, de forma crescente. A corrente se quebrou na última eleição, 2010, quando Ana Olivera ganhou a prefeitura da capital, com 45% dos votos. Foi a primeira e brutal queda na preferência popular da Frente Ampla, que na eleição anterior, 2005, tinha consagrado o prefeito Ricardo Ehrlich com 61% dos votos.

O ex-guerrilheiro José Mujica, hoje com 78 anos, foi eleito presidente em 2009 com 53% dos votos dos uruguaios.

Muitos deles carregavam, na memória, os fatos e crenças que um dia levaram Mujica a resistir, de armas na mão, ao regime de força que se abateu sobre o seu país.

Muito deles lembram, agora, a coerência das ideias e o espírito de luta que a valente juíza Mariana Mota sustentou, quase sozinha, para fazer prevalecer a justiça e a verdade sempre esmagadas pelos dinossauros.

O Uruguai guardará para sempre na memória o exemplo de luta de Mariana Mota.

Nenhum uruguaio jamais esquecerá como José Mujica esmagou sua própria biografia.

Um peso esmagador na consciência do país. Como um dinossauro.

*Luiz Cláudio Cunha é jornalista. Autor do livro “Operação Condor: o Sequestro dos Uruguaios”, no dia 19 de Setembro de 2012, Cunha foi oficializado como consultor da Comissão da Verdade, com a missão de coordenar um grupo de trabalho sobre a Operação Condor. É colaborador do “Quem tem medo da democracia?”, onde mantém a coluna“De Talho“. Quem quiser se comunicar diretamente com o autor, pode fazê-lo através do e-mail cunha.luizclaudio@gmail.com


https://www.youtube.com/watch?v=iR-1jlg5sdc



ANTOLÓGICO: Um dos maiores fiascos da história dos grandes eventos da ONU foi a Conferência sobre Mudanças Climáticas, conhecida como COP-15, realizada em Copenhagen. 15 anos após a definição do Protocolo de Kyoto, que estabeleceria normais mundiais para a redução das emissões de gases contaminantes, a Conferência chegou ao fim sem nenhuma única resolução concreta, em meio a um grande embate diplomático e grandes manifestações de rua. No Brasil, a grande mídia deu um grande destaque ao discurso do então presidente Lula, como tendo sido o mais importante da Conferência. A mídia alternativa de esquerda, por sua vez, deu grande repercussão ao discurso do presidente da Bolívia Evo Morales. No entanto, ambos os discursos não chegam aos pés do que foi realmente o grande discurso da Conferência. Em seu pronunciamento (totalmente abafado pela grande mídia e ignorado pela esquerda brasileira), o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, fez um dos discursos ambientalistas mais contundentes da história das Nações Unidas, citando, dentre outros, o pensador brasileiro Leonardo Boff e alguns dos lemas que se gritavam nas ruas. Não deixe de assistir este momento histórico, pela primeira vez legendado e traduzido em português, e ajude a divulgá-lo para que o Brasil, e sobretudo seus ambientalistas, possam conhecer. Mais um vídeo raro e essencial editado e legendado pela página "Ocupa a Rede Globo".

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Carta à Dilma



Ribamar Bessa – Carta à Dilma anuncia o descobrimento de Brasília

PEC charge

Por Ribamar Bessa(*)

Senhora,
Posto que os caciques e outros dos nossos não encontraram Vossa Excelência no Palácio do Planalto quando ali foram pessoalmente dar-lhe notícia do achamento desta terra nova, não deixarei eu de contar-lhe como melhor puder, ainda que para o bem contar e falar seja eu o pior de todos indicado. Tome, porém, minha ignorância por boa vontade e creia por certo que, para aformosear ou afear, não escreverei aqui mais do que aquilo que me pareceu e o que vi nos telejornais, na mídia e nas redes sociais.
Senhora, há cinco séculos, o escrivão da frota Pero Vaz de Caminha, em carta ao rei de Portugal, D. Manuel, o Venturoso, noticiou que portugueses, navegando em caravelas, “descobriram” o Brasil em 22 de abril de 1500 e “foram recebidos com muito prazer e festa” pelos habitantes locais, “muitos deles dançando e folgando, uns diante dos outros”. Caminha descreveu como viviam os nativos.
Cinco séculos depois, autonomeado que fui escrivão dos povos originários, escrevo na primeira pessoal do plural para informar-lhe que nós, 600 índios de 73 etnias, transportados por ônibus, desembarcamos na Câmara dos Deputados, em 16 de abril de 2013 e “descobrimos” Brasília, uma terra em que se mamando, tudo dá.
Não recebemos, porém, tratamento festivo, embora buscássemos contato pacífico com a tribo local dos deputados, formada exclusivamente por caciques que não caçam, não pescam, não plantam, mas comem em excesso. Glutões, seus hábitos alimentares e sua ociosidade fazem com que acumulem gordura no abdômen. São gordos, roliços e enxundiosos, com barriga flácida e proeminente. Apesar do intenso calor, cobrem suas vergonhas com tecidos quase sempre escuros, usam tira de pano apertada no pescoço e escondem o chulé dentro de mini-canoa de couro, uma em cada pé.
Brado retumbante
Eles acham que tal aparência lhes dá respeitabilidade. Têm a cabeça raspada até por cima das orelhas. Quem não é careca usa nos cabelos tintura castanho-avermelhada de acaju ou tinta preta como as penas do jacamim, o que lhes dá um brilho metálico e, aos nossos olhos, uma aparência decrépita. Acontece que um deles, Francisco Escórcio Lima (PMDB/MA vixe, vixe) registrou nossa chegada não como “descobrimento”, mas como “invasão”. As imagens da TV Câmara gravaram seu brado retumbante:
- “Os índios estão ali forçando para invadir o plenário. É uma situação em que todo mundo está com medo” – gritava da tribuna, ofegante, Chiquinho Escórcio, pálido, encagaçado, se borrando todo, semeando o pânico.
E olhe, Senhora, que a situação devia estar mesmo periquitomena, pois Chiquinho Escórcio, um empresário de 65 anos, ex-PFL e ex-PP (vixe²), é um parlamentar aguerrido que não foge do pau. Ele está acostumado, no pequeno expediente, a fazer discursos eloquentes sobre temas de transcendental importância para os destinos do país, conforme as atas da Câmara, que registram tudo com palavras desenhadas no papel, já que aqueles oradores têm o pensamento cheio de esquecimento.
Consultamos o penúltimo discurso (27/04/2013), quando Chiquinho demonstrou coragem desassombrada e usou sua convincente oratória para anunciar ao Brasil e quiçá ao mundo a presença naquele momento, no plenário, da prefeita do município de Chapadinha (MA), Ducilene Belezinha.
Mas não ficou aí. Foi muito mais longe. O site da Câmara reproduz discurso anterior (05/11/2012) no qual, sem medo à represália, Chiquinho demonstra insatisfação com o desempenho do Vasco da Gama no Campeonato Brasileiro de Futebol. Copiamos da página dele no site da Câmara um breve trecho da sua fala esclarecedora e patriótica:
“O SR. FRANCISCO ESCÓRCIO (PMDB-MA. Sem revisão do orador): – O que está havendo com o nosso Vasco da Gama, Deputado Onofre? Nós temos que ajeitar isso. Não é possível! Temos que chamar Roberto Dinamite aqui e perguntar: “Roberto, o que está acontecendo?” Depois que lhe fizemos aquela homenagem toda, o Vasco da Gama caiu pelas tabelas. Vamos dar uma ajeitada naquele time, porque é o time de coração de quase todos nós que somos brasileiros”.
Senhora, juramos que não estamos a inventar, queremos ver nossa mãe mortinha no inferno se mentimos. Nem sabemos quem é Onofre, nem Ducilene Belezinha no jogo do bicho. Sabemos que torcedores invejosos do Flamengo são incapazes de avaliar a relevância de tal discurso, assim como não dimensionam o valor de outra peça de oratória de Chiquinho em homenagem ao Dia do Dentista (22/10/2012). A retórica dele mataria de inveja o padre Antônio Vieira.
Vale a pena pagar um salário de deputado ao Chiquinho, um puta orador, cujo verbo inflamado está a serviço das grandes causas. São discursos históricos que deveriam ser impressos em cartilhas e ensinados nas escolas. Por isso, Chiquinho está cheio de comendas: medalhas da Câmara Municipal de Chapadinha, da Ordem dos Timbiras e do Mérito Sarney “for important services rendered to the Brazilian people”, conforme anunciou o The Chapadinha Times, que destaca a contribuição por ele dada ao conceito de heroicidade.
Se gritar pega deputado
Quando nós, índios, entramos no plenário, o discurso de Chiquinho provocou debandada geral, corre-corre, fuga em massa, como quando os apaches, nos filmes americanos, atacam a cavalaria. Bastou gritar “pega deputado”, não ficou um, meu irmão! Foi um Deus-nos-acuda, um pega-pra-capar, um barata-voa, que não foi sequer dificultado pela pança untuosa e obscena dos fugitivos. As imagens da TV Câmara correram mundo e nos foram enviadas por uma amiga equatoriana lá de Quito, sugerindo que escrevêssemos esta carta.
Nós, índios, que descobrimos Brasília, desarmados, portando apenas maracás, queríamos tão somente solicitar ao presidente da Câmara, Henrique Alves (PMDB/RN, vixe vixe) a não instalação da comissão que pretende travar, no Congresso, a demarcação das terras indígenas através da proposta de emenda constitucional. Temos consciência de que não podemos disputar com temas de vital importância como a crise do Vasco da Gama ou o desfile heróico da Ducilene Belezinha.
No entanto, como não existe nenhum índio deputado, nós fomos lá exercer democraticamente um direito de pressão. Com um cocar azul, uma das nossas, Sônia Guajajara, exigiu a revogação da proposta de emenda constitucional:
- “Nós, povos indígenas, não vamos permitir que uma minoria da sociedade brasileira – esses ruralistas e grandes empresários – seja maior do que nossos territórios. Vamos lutar até o fim” – disse Sônia.
Com o auxílio de um tradutor, Raoni Metuktire, líder caiapó, soltou o verbo: “Nunca vou aceitar desmatamento nas terras indígena, nunca vou aceitar a construção de usina na área indígena, nunca vou aceitar mineração dentro de nossas terras”.
Obtivemos êxito momentâneo: a medida foi suspensa por seis meses. Resta perguntar: de quem fugiam os deputados?
- “Na correria, alguns parlamentares tinham mais medo de suas consciências do que dos manifestantes “armados” com penas e maracás” – escreveu a nossa ex-senadora Marina Silva, que presenciou as “cenas cômicas e tristes” e a reação à “invasão” indígena. Depois que os trabalhos foram suspensos, o deputado Alberto Lupion (DEM/PR – vixe²), agropecuarista e empresário, denunciou à TV Câmara:
- Nunca vi um desrespeito à democracia como vi hoje.
Embora tenha 61 anos, o deputado Lupion parece não ter visto o golpe militar de 1964, nem tomado conhecimento das torturas e assassinatos cometidos durante vinte anos no Brasil. Fundador e presidente da UDR no Paraná, em 1987, condecorado pelas Polícias Militares de vários estados como Alagoas, Rio de Janeiro e Brasília, Lupion encara como legítimo o lobby do agronegócio, mas considera “desrespeito à democracia” pressões pacíficas de índios e trabalhadores rurais. Ignora que – a frase não é nossa – “todos brasileiros têm sangue índio. Os pobres, nas veias; os ricos, nas mãos”.
Senhora, posto que a Certidão de Nascimento do Brasil, que foi a carta de Caminha, termina solicitando a transferência do genro do autor da Ilha de São Tomé, queremos reafirmar esse lado sarney do caráter nacional. Assim, comunicamos que um sobrinho nosso conhecido pela alcunha de Pão Molhado trabalha como analista do Seguro Social na Agência da Previdência Social de Maués (AM). O filho dele, de três aninhos, o Biscoitinho Molhado, vive em Manaus, longe do pai, de cuja atenção carece. Peço, portanto, a V. Exa., que desloque o Pão Molhado para Manaus.
E se alonguei essa carta, me perdoe, porque o desejo que tinha de vos dizer tudo, me fez por assim pelo miúdo.
Embora o Governo Dilma tenha sido implacável com nós, índios, engavetando processos de demarcação para agradar a bancada ruralista, beijamos as mãos de Vossa Excelência na esperança de que elas assinem documentos que garantam o usufruto de nossas terras como manda a Constituição. Do contrário, advertimos que já descobrimos Brasília e o Palácio do Planalto. O referido é verdade e dou fé. Assinado: Taquiprati Vais No Caminho, autonomeado escrivão dos índios.

P.S. – O link das imagens gravadas pela TV Câmara, enviado do Equador por Gabriela Bernal: http://www.facebook.com/photo.php?v=477768542289401&set=vb.272904466109144&type=2&theater

*José Ribamar Bessa Freire é antropólogo. Colabora com o “Quem tem medo da democracia?”, onde tem a coluna “Taqui Pra Ti”

O Discurso Proibido de Hugo Chávez na COP-15 (Legendado)

http://youtu.be/ApPMf1wQpw0

Escreva Lola Escreva: MACHISMO NA UNIVERSIDADE, ATÉ QUANDO?

Escreva Lola Escreva: MACHISMO NA UNIVERSIDADE, ATÉ QUANDO?: Fiquei bem decepcionada com os comentários no post (e fora dele) sobre o Happy Hour da Empregada na Veterinária da USP.  Foi um fes...

Mariana Aydar - Tá




http://youtu.be/XDBKnHJGwdo

Tá? - Mariana Aydar

Pra bom entendedor, meia palavra bas
Eu vou denunciar a sua ação nefas
Você amarga o mar, desflora a flores
Por onde você passa, o ar você empes

Não tem medida a sua ação imediatis
Não tem limite o seu sonho consumis
Você deixou na mata uma ferida expos
Você descore as cores dos corais na cos
Você aquece a Terra e enriquece a cus
Do roubo, do futuro e da beleza, augus

Mas do que vale tal riqueza?
Grande bos
Parece que de neto seu você não gos
Você decreta a morte, a vida indevis
Você declara guerra, paz, por mais bem quis
Não há em toda fauna, um animal tão bes
Mas já tem gente vendo que você não pres

Não vou dizer seu nome porque me desgas
Pra bom entendedor, meia palavra bas
Não vou dizer seu nome porque me desgas
Pra bom entendedor, meia palavra bas
Bom entendedor, meia palavra bas
Bom entendedor, meia palavra bas
Pra bom entendedor, meia palavra bas

Pra bom entendedor, meia palavra bas
Eu vou denunciar a sua ação nefas
Você amarga o mar, desflora a flores
Por onde você passa, o ar você empes

Não tem medida a sua ação imediatis
Não tem limite o seu sonho consumis
Você deixou na mata uma ferida expos
Você descore as cores do coral na cos
Você aquece a Terra e enriquece a cus
Do roubo, do futuro e da beleza, augus

Mas do que vale tal riqueza?
Grande bos
Parece que de neto seu você não gos
Você decreta a morte, a vida indevis
Você declara guerra, paz, por mais bem quis
Não há em toda fauna animal, um tão bes
Mas já tem gente vendo que você não pres

Não vou dizer seu nome porque me desgas
Pra bom entendedor, meia palavra bas
Não vou dizer seu nome porque me desgas
Pra bom entendedor, meia palavra bas
Bom entendedor, meia palavra bas
Bom entendedor, meia palavra bas
Pra bom entendedor, meia palavra bas... ta!

Link: http://www.vagalume.com.br/mariana-aydar/ta.html#ixzz2RsNqoJov

domingo, 28 de abril de 2013

O operário em construção

http://www.viniciusdemoraes.com.br/site/article.php3?id_article=206 O operário em construção E o Diabo, levando-o a um alto monte, mostrou-lhe num momento de tempo todos os reinos do mundo. E disse-lhe o Diabo: - Dar-te-ei todo este poder e a sua glória, porque a mim me foi entregue e dou-o a quem quero; portanto, se tu me adorares, tudo será teu. E Jesus, respondendo, disse-lhe: - Vai-te, Satanás; porque está escrito: adorarás o Senhor teu Deus e só a Ele servirás. Lucas, cap. V, vs. 5-8. Era ele que erguia casas Onde antes só havia chão. Como um pássaro sem asas Ele subia com as casas Que lhe brotavam da mão. Mas tudo desconhecia De sua grande missão: Não sabia, por exemplo Que a casa de um homem é um templo Um templo sem religião Como tampouco sabia Que a casa que ele fazia Sendo a sua liberdade Era a sua escravidão. De fato, como podia Um operário em construção Compreender por que um tijolo Valia mais do que um pão? Tijolos ele empilhava Com pá, cimento e esquadria Quanto ao pão, ele o comia... Mas fosse comer tijolo! E assim o operário ia Com suor e com cimento Erguendo uma casa aqui Adiante um apartamento Além uma igreja, à frente Um quartel e uma prisão: Prisão de que sofreria Não fosse, eventualmente Um operário em construção. Mas ele desconhecia Esse fato extraordinário: Que o operário faz a coisa E a coisa faz o operário. De forma que, certo dia À mesa, ao cortar o pão O operário foi tomado De uma súbita emoção Ao constatar assombrado Que tudo naquela mesa - Garrafa, prato, facão - Era ele quem os fazia Ele, um humilde operário, Um operário em construção. Olhou em torno: gamela Banco, enxerga, caldeirão Vidro, parede, janela Casa, cidade, nação! Tudo, tudo o que existia Era ele quem o fazia Ele, um humilde operário Um operário que sabia Exercer a profissão. Ah, homens de pensamento Não sabereis nunca o quanto Aquele humilde operário Soube naquele momento! Naquela casa vazia Que ele mesmo levantara Um mundo novo nascia De que sequer suspeitava. O operário emocionado Olhou sua própria mão Sua rude mão de operário De operário em construção E olhando bem para ela Teve um segundo a impressão De que não havia no mundo Coisa que fosse mais bela. Foi dentro da compreensão Desse instante solitário Que, tal sua construção Cresceu também o operário. Cresceu em alto e profundo Em largo e no coração E como tudo que cresce Ele não cresceu em vão Pois além do que sabia - Exercer a profissão - O operário adquiriu Uma nova dimensão: A dimensão da poesia. E um fato novo se viu Que a todos admirava: O que o operário dizia Outro operário escutava. E foi assim que o operário Do edifício em construção Que sempre dizia sim Começou a dizer não. E aprendeu a notar coisas A que não dava atenção: Notou que sua marmita Era o prato do patrão Que sua cerveja preta Era o uísque do patrão Que seu macacão de zuarte Era o terno do patrão Que o casebre onde morava Era a mansão do patrão Que seus dois pés andarilhos Eram as rodas do patrão Que a dureza do seu dia Era a noite do patrão Que sua imensa fadiga Era amiga do patrão. E o operário disse: Não! E o operário fez-se forte Na sua resolução. Como era de se esperar As bocas da delação Começaram a dizer coisas Aos ouvidos do patrão. Mas o patrão não queria Nenhuma preocupação - "Convençam-no" do contrário - Disse ele sobre o operário E ao dizer isso sorria. Dia seguinte, o operário Ao sair da construção Viu-se súbito cercado Dos homens da delação E sofreu, por destinado Sua primeira agressão. Teve seu rosto cuspido Teve seu braço quebrado Mas quando foi perguntado O operário disse: Não! Em vão sofrera o operário Sua primeira agressão Muitas outras se seguiram Muitas outras seguirão. Porém, por imprescindível Ao edifício em construção Seu trabalho prosseguia E todo o seu sofrimento Misturava-se ao cimento Da construção que crescia. Sentindo que a violência Não dobraria o operário Um dia tentou o patrão Dobrá-lo de modo vário. De sorte que o foi levando Ao alto da construção E num momento de tempo Mostrou-lhe toda a região E apontando-a ao operário Fez-lhe esta declaração: - Dar-te-ei todo esse poder E a sua satisfação Porque a mim me foi entregue E dou-o a quem bem quiser. Dou-te tempo de lazer Dou-te tempo de mulher. Portanto, tudo o que vês Será teu se me adorares E, ainda mais, se abandonares O que te faz dizer não. Disse, e fitou o operário Que olhava e que refletia Mas o que via o operário O patrão nunca veria. O operário via as casas E dentro das estruturas Via coisas, objetos Produtos, manufaturas. Via tudo o que fazia O lucro do seu patrão E em cada coisa que via Misteriosamente havia A marca de sua mão. E o operário disse: Não! - Loucura! - gritou o patrão Não vês o que te dou eu? - Mentira! - disse o operário Não podes dar-me o que é meu. E um grande silêncio fez-se Dentro do seu coração Um silêncio de martírios Um silêncio de prisão. Um silêncio povoado De pedidos de perdão Um silêncio apavorado Com o medo em solidão. Um silêncio de torturas E gritos de maldição Um silêncio de fraturas A se arrastarem no chão. E o operário ouviu a voz De todos os seus irmãos Os seus irmãos que morreram Por outros que viverão. Uma esperança sincera Cresceu no seu coração E dentro da tarde mansa Agigantou-se a razão De um homem pobre e esquecido Razão porém que fizera Em operário construído O operário em construção. Seções Poesia Livros Encontre o que você procura no acervo completo das obras de Vinicius de Moraes.

New York Herald

Quando da indicação de Abraham Lincoln como candidato à presidência, o então prestigiado jornal New York Herald publicou: “Eles escolheram um palestrante de quarta categoria que não sabe falar corretamente, e cujos discursos são composições marcadas pela falta de cultura entremeadas de anedotas vulgares e sem graça”.

Ponha-se na Rua - Andréa Dip

Ponha-se na Rua: há 200 anos é assim que o governo lida com as comunidades cariocas 23.04.13 Por Andrea Dip #CopaPública 23.04.13 Por Andrea Dip #CopaPública Comunidade após as remoções por conta do Metrô-Mangueira (Foto: Paula Paiva Paulo) Francisca, ex moradora da Restinga que agora mora na Comunidade do Fontela. Crianças da Vila Autódromo (Foto: Paula Paiva Paulo) Criança brinca num campinho improvisado na Vila Autódromo (Foto: Paula Paiva Paulo) Parquinho na Vila Autódromo (Foto: Paula Paiva Paulo) Casas demolidas nas proximidades da estação de metrô Mangueira (Foto: Paula Paiva Paulo) Casas demolidas nas proximidades da estação de metrô Mangueira (Foto: Paula Paiva Paulo) Eomar Freitas, um dos moradores que perdeu a casa no Metrô-Mangueira (Foto: Paula Paiva Paulo) Jornalista, que pesquisou o histórico de despejos das comunidades no Rio, vê agravamento da situação com a proximidade dos megaeventos [+] [-] [*] Com a chegada da família real ao Brasil, em 1808, 10 mil casas foram pintadas com as letras “PR”, de Príncipe Regente, abreviatura que significava na prática que o morador teria que sair de sua casa para dar lugar à realeza. Logo, a sigla “PR” ficou popularmente conhecida como “Ponha-se na Rua”. Hoje, as casas removidas no Rio de Janeiro são marcadas com as letras “SMH”, de Secretaria Municipal de Habitação. A população também criou um apelido para a sigla: “Sai do Morro Hoje”. Essa associação entre as duas eras de despejo – que afetam sempre a mesma população – é feita em “Do ‘Ponha-se na Rua’ ao ‘Sai do Morro Hoje’: das raízes históricas das remoções à construção da “cidade olímpica”, trabalho de conclusão de curso da jornalista Paula Paiva Paulo. Em entrevista à Pública, ela fala pela primeira vez sobre o estudo que revê as transformações no espaço público carioca e as remoções compulsórias que preparam o cenário. E afirma: Os despejos não acontecem por “falta de planejamento” urbano. “É simplesmente privilegiar a especulação imobiliária ao invés do direito a moradia”, explicita. Por que você escolheu esse tema para o trabalho de conclusão? Quando comecei a pensar sobre o tema da minha monografia, não foi difícil, o tema da habitação sempre me atraiu. A minha ideia inicial era abordar tudo: um histórico de políticas públicas para habitação, o que diz a Constituição sobre direito à moradia, qual o déficit do país, o que esse déficit causa, o descaso do governo, o sonho da casa própria, e as histórias de pessoas afetadas – pelo menos um relato de um morador de rua, um de ocupação urbana e um de área de risco. Em março de 2012 comecei a participar do Grupo de Trabalho (GT) Remoções do Comitê Popular Rio para Copa e Olimpíadas, organização civil que reúne representantes de ONGs, de movimentos sociais, estudantes e qualquer pessoa que queira discutir e pesquisar sobre as violações de direitos humanos na preparação para os megaeventos no Rio de Janeiro. Ao entrar em contato com os moradores de comunidades ameaçadas, como Arroio Pavuna e Vila Autódromo, achei o meu gancho. O meu trabalho seria uma grande reportagem sobre as remoções que estavam acontecendo em razão da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas em 2016. Das comunidades removidas para os megaeventos, qual ou quais você acredita serem as mais emblemáticas desta época? Considero duas bem emblemáticas: a Restinga, no Recreio dos Bandeirantes, e o Metrô-Mangueira, na Mangueira. Na Restinga aconteceu todo o processo que tem sido padrão de reclamação dos moradores das comunidades removidas: falta de informação relativa ao projeto, falta de participação durante as remoções, oferecimento de alternativas desinteressantes para as famílias e truculência policial no ato da remoção. Essa última queixa é que torna a Restinga emblemática. O dia da remoção, dia 17 de dezembro de 2010, uma sexta-feira, foi considerado muitíssimo traumático pelos moradores. Sem aviso prévio, com forte aparato policial, remoções acontecendo madrugada adentro, sem as famílias terem sido indenizadas. Para o defensor público que atendeu a comunidade na época, Alexandre Mendes, foi a comunidade que mais sofreu nesse processo. Já o caso do Metrô-Mangueira, que fica a 500 metros do Maracanã é emblemático pela situação que alguns moradores ficaram durante um ano e meio. Após as primeiras remoções, as casas eram demolidas, e quem ficava tinha que viver entre os entulhos, que não eram retirados, e acumulavam lixo, água parada, ratos.Como me disse um ex- morador, Eomar Freitas: “Se você conseguir entrar em alguma casa que ainda está de pé, vai ver o odor de merda que tem, e a gente tinha de almoçar, a gente tinha de jantar, a gente tinha de conviver com esse cheiro”. O que mais te chocou ou entristeceu durante a pesquisa? O que mais me entristeceu foi o tratamento recebido pelas famílias removidas. É tudo feito com muita brutalidade, desde o anúncio da remoção. É pressão o tempo inteiro, e os moradores são tratados como “ilegais”, independente de sua situação fundiária, mesmo com os direitos adquiridos que nossas leis nos reservam. A moradia vai muito além de quatro paredes, ela está ligada ao direito ao trabalho, ao lazer, à saúde. É um processo muito traumático, e no qual não se faz nada para que ele seja menos traumático, muito pelo contrário. O ideal seria que esses processos fossem acompanhados de assistência psicológica aos moradores. Na verdade, ideal mesmo é que se buscassem outras soluções em vez da remoção forçada. Apesar de não ser novidade na história do Rio de Janeiro, agora vivemos situação específica inaugurada por dois megaeventos esportivos e pelas transformações urbanísticas que eles impõem à cidade. E há um grande agravante: as remoções estão acontecendo de forma sistêmica e integrada nas 12 cidades-sede da Copa no Brasil, com a justificativa da urgência e com uma paixão nacional como bandeira. É praticamente um herege quem vai de encontro a um projeto desses. Em seu estudo você fala de várias outras transformações no espaço público carioca. Quais foram as principais? Elas também removeram muita gente? Acredito que a principal tenha sido a reforma realizada pelo engenheiro Francisco Pereira Passos, nomeado prefeito do Rio de Janeiro pelo então presidente Rodrigues Alves, em 1904. Inspirado em Haussmann, o prefeito de Paris responsável pela sua reforma urbana no final do século XIX, a reforma de Pereira Passos teve como principais características o alargamento das principais artérias do Centro, a criação da Avenida Beira Mar para melhorar o acesso da Zona Sul ao Centro; a construção do Teatro Municipal; a ligação da Lapa com o Estácio; guerra aos quiosques e ambulantes; inauguração de estátuas imponentes e arborização no centro. Na maioria dos casos, a prefeitura desapropriou mais prédios do que eram necessários para depois vender o que ficou valorizado. Em paralelo às obras da prefeitura, a União também realizou grandes obras, como a construção da Avenida Central, atual Rio Branco, que demoliu de duas a três mil casas, o novo porto do Rio de Janeiro, e a abertura das avenidas que lhe davam acesso, a Francisco Bicalho e a Rodrigues Alves. É a partir daí que os morros do Centro (Providência, Santo Antônio, Castelo e outros) até então pouco habitados, passam a ser rapidamente ocupados. Ainda assim, a maior parte das pessoas que perderam suas casas não foi para as favelas centrais, e sim para o subúrbio, principalmente Engenho Novo e Inhaúma. O que você chama de era das remoções? Esse termo foi retirado do excelente livro do historiador Mário Brum, “Cidade Alta – História, memórias e estigma de favela num conjunto habitacional do Rio de Janeiro”. Ele se refere ao período de 1963 a 1975, no qual foram removidas mais de 175 mil pessoas somente no Rio de Janeiro. O então governador do Estado da Guanabara, Carlos Lacerda, trabalhou com as duas perspectivas, primeiro, com o criado Serviço Especial de Recuperação de Favelas e Habitações Anti-Higiênicas (Serfha), com a perspectiva da urbanização. Depois, com a extinção do Serfha e a subordinação dos órgãos habitacionais à Secretaria de Serviços Sociais, criada em 1963, a política habitacional passou a trabalhar com muito empenho com a perspectiva remocionista, já que, com a especulação imobiliária, políticos e construtoras tinham interesse na “desfavelização” da Zona Sul. De acordo com Mário Brum, as primeiras remoções foram em áreas de obras, como as favelas da Avenida Brasil, removidas para a construção do Mercado de São Sebastião, e a favela do Esqueleto, retirada para a construção da UERJ, no Maracanã. Em um segundo momento, as remoções visaram favelas em terrenos de alto valor imobiliário, como o caso da Favela do Pasmado, em Botafogo. Com o financiamento americano (Usaid), entre 1962 e 1965, foram construídas a Cidade de Deus e as Vilas Kennedy, Aliança e Esperança. Por outro lado, algumas favelas foram urbanizadas. Em 1964, com o golpe militar e o início da ditadura no Brasil, o fechamento dos canais democráticos criou as condições necessárias para as remoções arbitrárias. Além disso, na conjuntura da Guerra Fria, o favelado era um revolucionário em potencial aos olhos do governo. Nesse mesmo ano foi criado o Banco Nacional de Habitação (BNH), órgão financiador e responsável por programas habitacionais. As construções dos conjuntos habitacionais acompanhavam a remoção de favelas. Em 1964, 2273 famílias perderiam suas casas com a remoção completa de comunidades em Botafogo, Leblon, Ramos, Duque de Caxias; e despejos parciais no Humaitá, na Gávea, no Caju. E as remoções continuaram no ano seguinte, sendo a maior delas a da comunidade do Esqueleto, no Maracanã. Segundo dados da Cohab, no governo Lacerda foram removidas 6.290 famílias, sendo 4.800 de janeiro de 64 a julho de 65. Até 1965, 30 mil pessoas foram removidas, o que foi pouco perto do que estava por vir. Em 1968, a Federação das Associações de Favelas do Estado da Guanabara (Fafeg) ainda realizou seu 2º Congresso. No entanto, com traumáticas remoções na região da Lagoa Rodrigo de Freitas, a resistência perdeu espaço para o receio: a resistência dos moradores da Praia do Pinto, por exemplo, terminou com um misterioso incêndio na favela. Nese mesmo ano, o governo federal criou a Coordenação da Habitação de Interesse Social da Área Metropolitana do Grande Rio (Chisam), com o objetivo de criar uma política única de favela para o Rio. A Chisam definia a favela como um “espaço urbano deformado” e sua missão declarada era erradicá-las. Na ditadura, a Chisam virou a “autoridade” do programa remocionista. Era ela quem decidia quais favelas a serem removidas e onde ficariam os conjuntos, pois muitos terrenos eram do governo federal. E, na prática, quem executava as coisas era o governo do Estado. A Chisam, extinta em 1973, removeu mais de 175 mil moradores de 62 favelas (remoção total ou parcial), transferindo-os para novas 35.517 unidades habitacionais em conjuntos nas zonas Norte e Oeste. A construção desses conjuntos habitacionais nem de longe resolveu o problema da habitação popular, mas modificou substancialmente a forma-aparência dos subúrbios, além de levar uma demanda grande de pessoas para onde não havia a infraestrutura necessária. Após esse período, houve o esvaziamento do programa de remoções que tinha um alto custo político pela resistência dos moradores e que já tinha cumprido sua função de desocupar áreas de grande valor imobiliário e desmantelar a organização política dos favelados. Com a redemocratização do país, houve a revalorização da “moeda voto”. O que você vê de diferente entre este histórico de remoções no Rio e o que está acontecendo agora? Há diferença de abordagem? Antes era imperativa a ideia de remoção total das favelas como solução para a cidade. Isso foi superado depois da grande força dos movimentos sociais dos anos 80 e da nossa Constituição de 88. No Plano Diretor do Rio de Janeiro de 1992 se consolida o pensamento de integração das favelas à cidade; o Plano prevê a urbanização e a regularização fundiária, e a favela é definida por características técnicas de sua estrutura, e não mais por características morais dos moradores. Sem dúvida isso é uma evolução e deu partida a projetos como o Favela-Bairro. No entanto, os movimentos que lutam pelos direitos humanos, sendo o direito à moradia um deles, não conseguir garantir esse direito na prática. E esse é um grande passo para trás. Outro passo para trás: apesar de não haver mais a justificativa da remoção como solução urbanística, ela está mais mascarada. E há um grande agravante, que são as remoções acontecendo de forma sistêmica e integrada nas 12 cidades-sede da Copa no Brasil, com a justificativa da urgência e com uma paixão nacional como bandeira. As obras para mobilidade urbana e construção de equipamentos esportivos não são consideradas questionáveis, e quem questiona é chamado de “do contra, baderneiro”. A que você acha que se deve este histórico? A primeira coisa que me vem à cabeça é “falta de planejamento urbano”. Mas na verdade o que não faltou foi planejamento. Acho que esse histórico se deve a predominância do interesse do capital na construção e ocupação da cidade. Preferiu-se e ainda se prefere privilegiar a especulação imobiliária ao direito à moradia. O blog Copa Pública é uma experiência de jornalismo cidadão que mostra como a população brasileira tem sido afetada pelos preparativos para a Copa de 2014 – e como está se organizando para não ficar de fora. comments Últimas Reportagens Infográfico: Maracanã, concessão bilionária Ponha-se na Rua: há 200 anos é assim que o governo lida com as comunidades cariocas WIKILEAKS: DEA infiltrou agentes em círculo de Cartes para investigar lavagem de dinheiro Greve de fome, prisão sem fim: o que está acontecendo em Guantánamo Dow como patrocinadora contraria espírito olímpico, acusa ONG Histórias semelhantes maracana_info_capa (1) Infográfico: Maracanã, concessão bilionária Depois de um gasto de R$ 1,7 bilhão de verbas públicas em reformas, o estádio vai passar para mãos privadas, a quem renderá um lucro de R$ 2,9 bilhões em 35 anos Morador de Itaquera observa as obras do entorno do futuro estádio do Corinthians (Foto: Saulo Tomé) Copa traz mais atraso à zona leste Prefeitura e Estado firmam convênio para acelerar obras em torno do estádio; mudanças viárias prioritárias para a região são deixadas de lado A comunidade da Paz é uma das atingidas no projeto de desenvolvimento da Zona Leste Vídeo traz a versão dos vizinhos do Itaquerão

sábado, 27 de abril de 2013

Mlton Hatoum

lton Hatoum - O Estado de S.Paulo Pegava o ônibus às cinco da manhã, atravessava vários bairros de São Paulo e chegava à rodoviária antes do amanhecer. Às vezes saltava na Avenida Ipiranga e andava por ruas que eu havia percorrido no mês anterior, gritando palavras pela liberdade. Só mais tarde alguém notava a ausência de um amigo, que podia estar encarcerado no edifício de tijolos aparentes ou em outra delegacia. Fazia frio naquela madrugada de agosto, e lá se vai um quarto de século. Ainda vejo as mulheres na Rua do Triunfo, algumas sem agasalho, à espera de um carro, nem que fosse táxi. Há poucos homens nas ruas: bêbados caídos no Largo General Osório e trabalhadores humildes que se dirigem à Estação da Luz; alguns vão para onde vou: a rodoviária de São Paulo, coberta por gomos coloridos de acrílico, abrigo de tanta gente que vem de muito longe para sonhar e trabalhar aqui. No guichê da viação Pássaro Marrom comprei a passagem para o Vale do Paraíba; depois, na tabacaria Citaba, conversei um pouco com o velho Edmundo. Quando um grupo de nordestinos se aproximou, o velho Ed lhes deu cigarros: que vendessem lá embaixo, na porta dos hotéis e na entrada da Sorocabana. Caminhei a esmo pelas plataformas de embarque, tomei café e conhaque para matar de uma só vez o frio e o sono. Seis e cinco no relógio da torre da Sorocabana. Os gomos de acrílico filtravam uma luz baça: São Paulo talvez amanheça também para os passageiros insones e mendigos exaustos. Não longe dali, o edifício escuro e sinistro, vigiado por homens armados. Comprei um jornal e desci à plataforma número quatro. Li as manchetes e observei os rostos na manhã ainda indecisa. Quando ia abrir o jornal, um ônibus verde metálico apareceu na plataforma A4 e parou. Destino: Brasília. Cortinas escuras vedavam várias janelas, e na última vi um rosto pálido, os óculos de lentes grossas e aros pretos, olhos azulados e meio embaçados. Ergui as mãos, sem ter certeza de que era ele. Não olhou para mim: parecia ausente. Me aproximei da janela: ele me olhou com tristeza ou cansaço e percebi que podia ser outro... O motorista fechou a porta do ônibus, a fumaça escureceu a plataforma, o ronco do motor e uma buzina estridente anunciaram a partida. Ele ainda virou o rosto para o banco onde eu estava sentado, e pela última vez pensei que podia ser meu amigo. Pouco depois, na beira da Via Dutra, vi trabalhadores agachados ao redor de uma fogueira. O dia cinza e frio de agosto não queria amanhecer... Recordei que ele havia desaparecido em outubro de 1973, e eu viajava para Taubaté numa manhã de 1978. Ele não teria viajado livremente a Brasília, onde tinha sido caçado. Não voltaria à UnB, de onde fora banido para sempre. A rodoviária não é mais ali, e o edifício grandioso e sinistro perdeu seus cárceres e corredores escuros. Os assassinos de Honestino andam soltos e impunes por aí? Ainda riem dos que foram torturados e jogados no fundo da terra calcinada? Ou são apenas fantasmas de uma história infame?

Darwin e a prática da 'Salami Science'

Darwin e a prática da 'Salami Science' 27 de abril de 2013 | 2h 03 FERNANDO REINACH - O Estado de S.Paulo Em 1985, ouvi pela primeira vez no Laboratório de Biologia Molecular a expressão "Salami Science". Um de nós estava com uma pilha de trabalhos científicos quando Max Perutz se aproximou. Um jovem disse que estava lendo trabalhos de um famoso cientista dos EUA. Perutz olhou a pilha e murmurou: "Salami Science, espero que não chegue aqui". Mas a praga se espalhou pelo mundo e agora assola a comunidade científica brasileira. "Salami Science" é a prática de fatiar uma única descoberta, como um salame, para publicá-la no maior número possível de artigos científicos. O cientista aumenta seu currículo e cria a impressão de que é muito produtivo. O leitor é forçado a juntar as fatias para entender o todo. As revistas ficam abarrotadas. E avaliar um cientista fica mais difícil. Apesar disso, a "Salami Science" se espalhou, induzido pela busca obsessiva de um método quantitativo capaz de avaliar a produção acadêmica. No Laboratório de Biologia Molecular, nossos ídolos eram os cinco prêmios Nobel do prédio. Publicar muitos artigos indicava falta de rigor intelectual. Eles valorizavam a capacidade de criar uma maneira engenhosa para destrinchar um problema importante. Aprendíamos que o objetivo era desvendar os mistérios da natureza. Publicar um artigo era consequência de um trabalho financiado com dinheiro público, servia para comunicar a nova descoberta. O trabalho deveria ser simples, claro e didático. O exemplo a ser seguido eram as duas páginas em que Watson e Crick descreveram a estrutura do DNA. Você se tornaria um cientista de respeito se o esforço de uma vida pudesse ser resumido em uma frase: Ele descobriu... Os três pontinhos teriam de ser uma ou duas palavras: a estrutura do DNA (Watson e Crick), a estrutura das proteínas (Max Perutz), a teoria da Relatividade (Einstein). Sabíamos que poucos chegariam lá, mas o importante era ter certeza de que havíamos gasto a vida atrás de algo importante. Hoje, nas melhores universidade do Brasil, a conversa entre pós-graduandos e cientistas é outra. A maioria está preocupada com quantos trabalhos publicou no último ano - e onde. Querem saber como serão classificados. "Fulano agora é pesquisador 1B no CNPq. Com 8 trabalhos em revistas de alto impacto no ano passado, não poderia ser diferente." "O departamento de beltrano foi rebaixado para 4 pela Capes. Também, com poucas teses no ano passado e só duas publicações em revistas de baixo impacto..." Não que os olhos dessas pessoas não brilhem quando discutem suas pesquisas, mas o relato de como alguém emplacou um trabalho na Nature causa mais alvoroço que o de uma nova maneira de abordar um problema dito insolúvel. Essa mudança de cultura ocorreu porque agora os cientistas e suas instituições são avaliados a partir de fórmulas matemáticas que levam em conta três ingredientes, combinados ao gosto do freguês: número de trabalhos publicados, quantas vezes esses trabalhos foram citados na literatura e qualidade das revistas (medida pela quantidade de citações a trabalhos publicados na revista). Você estranhou a ausência de palavras como qualidade, criatividade e originalidade? Se conversar com um burocrata da ciência, ele tentará te explicar como esses índices englobam de maneira objetiva conceitos tão subjetivos. E não adianta argumentar que Einstein, Crick e Perutz teriam sido excluídos por esses critérios. No fundo, essas pessoas acreditam que cientistas desse calibre não podem surgir no Brasil. O resultado é que em algumas pós-graduações da USP o credenciamento de orientadores depende unicamente do total de trabalhos publicados, em outras o pré-requisito para uma tese ser defendida é que um ou mais trabalhos tenham sido aceitos para publicação. Não há dúvida de que métodos quantitativos são úteis para avaliar um cientista, mas usá-los de modo exclusivo, abdicando da capacidade subjetiva de identificar pessoas talentosas, criativas ou simplesmente geniais, é caminho seguro para excluir da carreira científica as poucas pessoas que realmente podem fazer descobertas importantes. Essa atitude isenta os responsáveis de tomar e defender decisões. É a covardia intelectual escondida por trás de algoritmos matemáticos. Mas o que Darwin tem a ver com isso? Foi ele que mostrou que uma das características que facilitam a sobrevivência é a capacidade de se adaptar aos ambientes. E os cientistas são animais como qualquer outro ser humano. Se a regra exige aumentar o número de trabalhos publicados, vou praticar "Salami Science". É necessário ser muito citado? Sem problema, minhas fatias de salame vão citar umas às outras e vou pedir a amigos que me citem. Em troca, garanto que vou citá-los. As revistas precisam de muitas citações? Basta pedir aos autores que citem artigos da própria revista. E, aos poucos, o objetivo da ciência deixa de ser entender a natureza e passa a ser publicar e ser citado. Se o trabalho é medíocre ou genial, pouco importa. Mas a ciência brasileira vai bem, o número de mestres aumenta, o de trabalhos cresce, assim como as citações. E a cada dia ficamos mais longe de ter cientistas que possam ser descritos em uma única frase: Ele descobriu...

O golpe de Thatcher

Funeral digno de um ditador

O golpe de Thatcher

por John Pilger
Após o desaparecimento de Thatcher, recordo suas vítimas. A filha de Patrick Warby, Marie, foi uma delas. Marie, com cinco anos, sofria de uma deformidade do intestino e precisava de uma dieta especial. Sem ela, o sofrimento era aflitivo. Seu pai era um mineiro de Durham e gastara todas as suas poupanças. Era o Inverno de 1985, a Grande Greve tinha quase um ano e a família estava empobrecida. Embora a necessidade de operação não fosse contestada, o Departamento de Segurança Social recusou ajuda a Marie. Posteriormente, obtive registos do caso mostrando que Marie fora recusada porque o seu pai era "influenciado por uma disputa sindical".

A corrupção e desumanidade sob Thatcher não conheciam fronteiras. Quando chegou ao poder em 1979, Thatcher pediu uma proibição total de exportações de leite para o Vietname. A invasão americana havia deixado um terço das crianças vietnamitas desnutridas.

Testemunhei muitas visões penosas, incluindo crianças a ficarem cegas devido à falta de vitaminas. "Não posso tolerar isto", disse um médico angustiado num hospital pediátrico de Saigão, quando olhávamos para um rapaz a morrer. A Oxfam e a Save the Children havido deixado claro para o governo britânico a gravidade da emergência. Um embargo conduzido pelos EUA havia forçado o preço local do quilo de leite a subir para dez vezes o do quilo de carne. Muitas crianças podiam ter sido recuperadas com leite. A proibição de Thatcher impediu.

No vizinho Camboja, Thatcher deixou um rastro de sangue, secretamente. Em 1980, ela exigiu que o defunto regime Pol Pot – o assassino de 1,7 milhão de pessoas – retivesse o seu "direito" a representar suas vítimas na ONU. A sua política era de vingança do libertador do Camboja, o Vietname. O representante britânico foi instruído a votar com Pol Pot na Organização Mundial de Saúde, impedindo-a dessa forma de proporcionar ajuda para o lugar onde era mais necessária do que qualquer outro na terra.

Para esconder esta infâmia, os EUA, a Grã-Bretanha e a China, os principais apoiantes de Pol Pot, inventaram uma "coligação de resistência" dominada pelas forças do Khmer Rouge de Pol Pot e abastecida pela CIA em bases ao longo da fronteira tailandesa. Havia uma dificuldade. Na sequência da derrocada do Irangate, armas-por-réfens, o Congresso dos EUA proibira aventuras clandestinas no estrangeiro. "Num daqueles acordos ambos gostavam de fazer", contou um alto responsável do Whitehall [1] ao Sunday Telegraph, "o presidente Reagan sugeriu a Thatcher que o SAS [2] deveria assumir o comando do show do Camboja. Ela prontamente concordou".

Em 1983, Thatcher enviou o SAS para treinar a "coligação" na sua própria e diferente marca de terrorismo. Sete equipes de homens do SAS chegaram de Hong Kong e soldados britânicos começaram a treinar "combatentes da resistência" em estender campos de minas num país devastado pelo genocídio e a mais alta taxa de mortes e mutilações do mundo devido a campos de minas.

Noticiei isto na altura e mais de 16 mil pessoas escreveram a Thatcher para protestar. "Confirmo", respondeu ela ao líder da oposição Neil Kinnock, "que não há envolvimento do governo britânico de qualquer espécie no treino, equipamento ou cooperação com o Khmer Rouge ou aliados dele". A mentira era de cortar o fôlego. Em 1991, o governo de John Major admitiu no parlamento que o SAS havia na verdade treinado a "coligação". "Nós gostamos dos britânicos", disse-me mais tarde um combatente do Khmer Rouge. "Eles foram muito bons a ensinar-nos a montar armadilhas explosivas (booby traps). Pessoas confiantes, como crianças em campos de arroz, foram as vítimas principais".

Quando os jornalistas e produtores do memorável documentário "Death on the Rock" , da ITV, revelaram como o SAS havia dirigido outros esquadrões da morte de Thatcher na Irlanda e em Gibraltar, foram perseguidos pelos "jornalistas" de Rupert Murdoch, então acovardados em Wapping [3] atrás do arame farpado. Embora absolvida, a Thames TV perdeu sua concessão da ITV.

Em 1982, o cruzador argentino General Belgrano navegava fora da zona de exclusão das Falklands [4] . O navio não constituía ameaça, mas Thatcher deu ordens para que fosse afundado. Suas vítimas foram 323 marinheiros, incluindo adolescentes alistados. O crime tinha uma certa lógica. Dentre os mais próximos aliados de Thatcher estavam assassinos em massa – Pinochet no Chile, Suharto na Indonésia, responsáveis por "muito mais do que um milhão de mortes" (Amnistia Internacional). Embora desde há muito o estado britânico armasse as principais tiranias do mundo, foi Thatcher que com um zelo de cruzado procurou tais acordos, conversando empolgada acerca das mais refinadas características de motores de aviões de combate, negociando arduamente com príncipes sauditas que pediam subornos. Filmei-os numa feira de armas, a acariciarem um míssil reluzente. "Terei um daqueles!", disse ela.

No seu inquérito das armas-para-o-Iraque, Lorde Richard Scott ouviu evidências de que toda uma camada do governo Thatcher, desde altos funcionários civis até ministros, mentira e infringira a lei na venda de armas a Saddam Hussein. Eram os seus "rapazes". Se folhear números antigos do Baghdad Observer encontrará na primeira página fotos dos seus rapazes, principalmente ministros do gabinete, sentados com Saddam na sua famosa poltrona branca. Ali está Douglas Hurd e um sorridente David Mellor, também do Foreign Office, na época em que o seu hospedeiro ordenava o gaseamento de 5000 curdos. A seguir a esta atrocidade, o governo Thatcher duplicou créditos comerciais para Saddam.

Talvez seja demasiado fácil dançar sobre a sua sepultura. O seu funeral foi uma proeza de propaganda, adequada a um ditador: uma mostra absurda de militarismo, como se se houvesse verificado um golpe. E foi. "O seu triunfo real", disse outro dos seus rapazes, Geoffrey Howe, ministro da Thatcher, "foi ter transformado não apenas um partido mas dois, de modo que quando o Labour finalmente retornou, a maior parte do thatcherismo era aceite como irreversível".

Em 1997, Thatcher foi o primeiro antigo primeiro-ministro a visitar Tony Blair depois de ele ter entrado na Downing Street [5] . Há uma foto deles, juntos num ricto: o criminoso de guerra em embrião com a sua mentora. Quando Ed Milliband, na sua untuosa "homenagem", travestiu Thatcher como "corajosa" heroína feminista cujas façanhas pessoalmente "admira", fica-se a saber que a velha assassina não morreu de todo.
25/Abril/2013
NT
(1) Whitehall: rua onde está o Parlamento britânico.
(2) SAS: tropas especiais britânicas.
(3) Wapping: bairro de Londres para onde Murdoch mudou a sua empresa, por trás de uma fortaleza a fim de fugir a pressões sindicais da Fleet Street.
(4) Falklands: Malvinas
(5) Downing Street: residência oficial do primeiro-ministro britânico.


O original encontra-se em www.counterpunch.org/2013/04/25/thatchers-coup/

Aloizio Mercadante bajula Folha


Aloizio Mercadante bajula Folha e esbofeteia vítimas da ditadura

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Na semana que finda, o ex-delegado da Polícia Civil Cláudio Guerra delatou o comparsa de atrocidades durante a ditadura militar, o fundador do jornal Folha de São Paulo, Octavio Frias de Oliveira (1912-2007). Revelou que ele visitava “frequentemente” o Dops (Departamento de Ordem Política e Social), que, como se sabe, era um centro de torturas.
A denúncia foi feita ao vereador Gilberto Natalini, presidente da Comissão da Verdade da Câmara Municipal de São Paulo. Além dessa denúncia, também revelou que a Folha emprestou carros e ajudou a financiar os órgãos da repressão na época – denúncia que não é nova e que figura no livro Cães de Guarda, da doutora em História Social Beatriz Kushnir.
Palavras do denunciante: “O Frias visitava o Dops constantemente. Isso está registrado.”
Sim, está registrado. Recentemente, a Comissão da Verdade de São Paulo recebeu o livro de visitas do DOPS, onde empresários como Frias parece que davam expediente, sendo “inexplicável” a razão para comparecerem a um centro de torturas e morte seguidas vezes.
Segundo a própria Folha de São Paulo, em matéria publicada na quinta-feira, “Guerra disse também que o publisher da Folha era ‘amigo pessoal’ do delegado Sérgio Paranhos Fleury, um dos mais ativos agentes da repressão”.
O depoimento do congênere de Frias durante a ditadura foi apresentado em vídeo na terça-feira em audiência da Comissão da Verdade na Câmara Municipal de São Paulo.
Verdade seja dita, a Folha publicou as denúncias contra si em sua edição de quinta-feira. A coragem do jornal, porém, contrasta com a covardia do ministro da Educação, Aloizio Mercadante, que enviou carta ao Painel do Leitor da publicação a fim de bajulá-la. Fazendo isso, Mercadante envergonhou o PT e esbofeteou as vítimas da ditadura.
Leia, abaixo, o texto patético de alguém que é fundador do PT e ministro da educação do governo Dilma e que foi publicado na edição da Folha desta sexta-feira.
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A Folha publicou notícia de que o empresário Octavio Frias de Oliveira visitou frequentemente o Dops e era amigo pessoal do delegado Sérgio Paranhos Fleury, um dos mais ativos agentes da repressão.
A denúncia partiu do ex-agente da repressão, Cláudio Guerra. Recebi a informação perplexo e incrédulo. Especialmente porque militei contra a ditadura militar na dura década de 70 e tive a oportunidade de testemunhar o papel desempenhado pelo jornal, sob o comando de “seu Frias”, na luta pelas liberdades democráticas.
A coluna de Perseu Abramo sempre foi referência da luta estudantil nos dias difíceis de repressão. A página de “Opinião” abriu espaço para o debate democrático e pluralista. A Folha contribuiu decisivamente para a campanha das Diretas Já.
Ao longo desses 40 anos de militância política, mesmo com opiniões muitas vezes opostas às da Folha, testemunho que o jornal sempre garantiu o debate e a pluralidade de ideias, que ajudaram a construir o Brasil democrático de hoje.
E “seu Frias” merece, por isso, meu reconhecimento. Acredito que falo por muitos da minha geração.
Aloizio Mercadante, ministro de Estado da Educação (Brasília, DF)
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Quem escreveu esse texto vergonhoso não foi um general de pijama nem um dos barões da mídia, foi um dos fundadores do PT em 1980, vice-presidente do partido entre 1991 e 1999, senador pelo estado de São Paulo entre 2003 e 2010, ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação do Brasil de 2011 a 2012 e que se tornou ministro da Educação no ano passado.
Apesar de Mercadante ser filho de general do Exército, não parece que seja essa a sua motivação para se fazer de desinformado e, assim, dar à Folha o que ela precisava, um depoimento em defesa de Frias pai por parte de alguém que, por ser petista, seria insuspeito de estar mentindo a favor dele – a Folha parece reconhecer que está publicando o depoimento de um adversário político.
Mercadante apenas bajula a Folha como tantos outros petistas que acham que podem ser menos pisoteados pelo jornal se rastejarem diante dele e se ajoelharem em seu altar de mentiras. Mas caso o ministro da educação seja apenas um idiota que chegou aonde chegou sem conhecer a história de seu país, aí vão alguns esclarecimentos a ele.
O homem fardado e a declaração na foto que encima este texto correspondem a Otávio Frias de Oliveira, o falecido fundador do jornal Folha de São Paulo. Imagem e palavras pertencem a momentos distintos de sua vida. Todavia, unidas, explicam quem foi ele.
Frias de Oliveira lutou na Revolução Constitucionalista de 1932, que tentou dar um golpe de Estado contra Getúlio Vargas. Coerente com seu apreço pelo militarismo e pela derrubada de governos dos quais não gostava, apoiou o golpe militar de 1964.
Nesse período, a Folha de São Paulo serviu de voz e pernas para os ditadores que se sucederiam no poder ao exaltá-los e ao transportar para eles seus presos políticos até os centros de tortura do regime.
No dia 21 de setembro de 1971, a Ação Libertadora Nacional (ALN) incendiou camionetes da Folha que eram utilizadas para entregar jornais. Os responsáveis acusavam o dono do jornal de emprestar os veículos para transporte de presos políticos. Frias de Oliveira respondeu ao atentado publicando um editorial na primeira página no dia seguinte, sob o título “Banditismo”.
Eis um trecho do texto:
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Os ataques do terrorismo não alterarão a nossa linha de conduta. Como o pior cego é o que não quer ver, o pior do terrorismo é não compreender que no Brasil não há lugar para ele. Nunca houve. E de maneira especial não há hoje, quando um governo sério, responsável, respeitável e com indiscutível apoio popular está levando o Brasil pelos seguros caminhos do desenvolvimento com justiça social-realidade que nenhum brasileiro lúcido pode negar, e que o mundo todo reconhece e proclama. [...] Um país, enfim, de onde a subversão -que se alimenta do ódio e cultiva a violência – está sendo definitivamente erradicada, com o decidido apoio do povo e da imprensa, que reflete os sentimentos deste. Essa mesma imprensa que os remanescentes do terror querem golpear.”
(Editorial: Banditismo – publicado em 22 de setembro de 1971; Octavio Frias de Oliveira).
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O presidente da República de então era Emílio Garrastazu Médici. Nomeado presidente pelos militares, comandou o período mais duro da ditadura militar. Foi a época do auge das prisões, torturas e assassinatos de militantes políticos de esquerda pelo regime.
Apesar dos elogios de Frias de Oliveira à ditadura, segundo a Fundação Getúlio Vargas foi no governo Médici que a miséria e a concentração de renda ganharam impulso. O Brasil teve o 9º Produto Nacional Bruto do mundo no período, mas em desnutrição perdia apenas para Índia, Indonésia, Bangladesh, Paquistão e Filipinas.
O que Aloizio Mercadante fez, não tem nome. Nem covardia e oportunismo definem seu ato. O petista, porém, engana-se sobre a Folha. Se for candidato a governador, ano que vem, terá oposição feroz do jornal. Sua bajulação foi inútil.
Concluo este texto, portanto, com uma promessa: enquanto eu viver, esse político nunca mais receberá um voto meu. Além disso, exorto quem me lê e concorda com o que aqui foi dito a fazer o mesmo, pois quem age como o ministro Aloizio Mercandante agiu não só não merece confiança, mas merece muita desconfiança.